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CRÍTICA
Globo faz baianidade cansada de guerra
XICO SÁ
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O Brasil de "Madame Satã",
de Karim Aïnouz, cearense
envelhecido no caldo das delicadezas do pensador Walter Benjamin, e o país de "Amarelo Manga", filme do caruaruense Claudio
Assis, cujo couro foi engrossado
léguas e léguas longe de Frankfurt, deixaram na poeira a suposta
cordialidade e o populismo que
tem nos diretores Guel Arraes
(batismo de núcleo da Globo) e
Walter Salles seus principais culpados no sentido de acossados
por Cristo, claro.
Mas, "ô pissit!" -como na linda evocação de "Os Trapalhões"
ao populacho do sofá-, o núcleo
Arraes voltou ao oratório de sempre. "Pastores da Noite" retorna à
Bahia repisada por tantas Tietas,
Gabrielas... O "meu rei" do exotique, o francês Marcel Camus, que
fez "Orfeu Negro", também filmou a mesma macumba acidental, em 75, que agora tem despacho televisivo.
O filme de Camus se chamava
"Otalia de Bahia", que os bons
orixás o tenham. Nada contra reciclagens de "Os Pastores da Noite", um dos raros livros interessantes de Jorge Amado. Mas, uma
vez que pretendem chafurdar em
uma dita brasilidade, por que não
coisas melhores? Todo mundo sabe que Graciliano Ramos é "o cara", como tem dito Romário sobre si mesmo. Pode não ter a malemolência pretendida pela Globo. Mas sexo e angústia -e existem outras matérias na vida?- o
alagoano tem de sobra.
É injusto dizer que a série global
é ruim de tudo. Matheus Nachtergale faz um pierrô-mascate do
cão. A outra cambada de macho,
que faz parte da mesma boa fase
do cinema nacional acima citado,
é uma desgraça na TV, tudo igual,
como na "leseira" de boteco.
Tem até Fernanda Montenegro,
no papel de dona do puteiro cordial de sempre, ave! A sorte é Camila Pitanga (Marialva), que não
tem nada a ver com Amado. É coisa de Gilberto Freyre, vale por toda a mestiçagem de "Casa-Grande & Senzala" e é infinitamente
superior a Sonia Braga em todos
os tempos.
Enfim, "Pastores..." é tão igual a
tudo que já se viu sobre o mesmo
tabuleiro que a saída é inverter a
dialética de Zeca Pagodinho no
seu último disco. Falo da faixa "Tá
Ruim, mas Tá Bom". Na série da
Globo, tá bom..., mas tá ruim.
Pastores da Noite
Onde: Globo, terça, às 22h35
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