São Paulo, domingo, 28 de dezembro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

BIA ABRAMO

Duas meninas e homens de preto


Maisa e Capitu são o pior e o melhor da TV; "CQC" é o principal programa de variedades em 2008

DUAS MENINAS simbolizam o melhor e o pior da TV em 2008. De um lado, a superexposta, explorada e explícita criança precoce Maisa; de outro, a adolescente Capitu, desvelada e revelada pela adulta Letícia Persiles.
De um lado, a máquina de fazer doido, que faz de uma pessoa, neste caso uma quase pessoa, ainda uma criança de seis anos (e só seis anos...), virar um personagem que é caricatura da graça, da espontaneidade, da beleza. De outro, a possibilidade de reinventar um personagem emblemático pela recriação dramatúrgica de uma graça e uma beleza de forma muito peculiar.
Apesar das enormes distâncias de gênero televisivo entre a fabricação de uma apresentadora-mirim de desenhos animados e a uma personagem ficcional recriada por uma atriz, há, nos dois casos, a manipulação de uma certa ilusão etária que se processa de forma muito semelhante, embora com efeitos e intenções opostos.
Num caso, faz-se acreditar que uma menina real pode ser, ao mesmo tempo, ingênua e espertíssima; em outras palavras, adulta e criança, de quem se poderá exigir e esperar as duas coisas, a ingenuidade e a esperteza. Num certo sentido, Maisa e Xuxa estão em duas pontas de uma mesma operação perversa, que consiste em eliminar as barreiras e os tabus etários para liberar o desfrute dos adultos.
Na minissérie, ao contrário, há uma manipulação consciente, claro, ao se colocar uma atriz adulta a interpretar uma adolescente. Mas aqui, estamos no terreno da ficção, onde o artifício serve, não para enganar, mas, de alguma forma, para revelar.
Capitu, 14, ganha uma inflexão sexualizada, apaixonada, que se torna possível porque, ao narrador adulto que rememora, interpôs-se a interpretação de uma outra pessoa adulta. É como se Letícia, 25, destrinçasse as contradições do desejo de uma adolescente justamente porque não o é (mas já foi).

 

Os homens de preto, leia-se "CQC", não apenas acharam um caminho que andava meio esquecido entre o escracho e a crítica para o humor brasileiro, como fizeram o melhor programa de variedades.
Em vez de tratar o jornalismo com leveza, o "CQC" utiliza instrumentos da investigação jornalística para mostrar o "outro lado" daquilo que se ser quer sério.
E, claro, eles produziram a melhor piada do ano. O fato de a gente ter tido de importar o formato da Argentina é prova de que a ironia é mesmo a fada-madrinha do humor bom.

biabramo.tv@uol.com.br


Texto Anterior: Resumo das novelas
Próximo Texto: Televisão/Crítica: Dramas com luta de classes são destaques
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.