São Paulo, sábado, 29 de janeiro de 2005

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Astro da ficção inventiva, Vila-Matas fala sobre "Bartleby e Companhia" e autores que pararam de escrever

Adeus às armas

Joan Sanchez/"El País"Enrique
Vila-Matas, autor de "Bartleby e Companhia' e de "Viagem Vertical', lançados no Brasil


CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

De todos os milhões de personagens literários que circulam por aí desde o início da ficção moderna poucos são mais esquisitos e atraentes do que um cidadão prensado ao papel pelo americano Herman "Moby Dick" Melville (1819-1891) em um conto que publicou anonimamente em 1853.
O protagonista de "Bartleby, o Escriturário", o que dá título à narrativa, é um burocrata; um copista que permanece o tempo todo no seu escritório, quase sempre espiando pela janela uma parede de tijolos de Wall Street. Não bebe chá, café ou cerveja, não lê nada, não abandona a sua sala nem aos domingos.
Sempre que perguntavam a Bartleby onde nasceu, se tinha algum amigo ou parente e cada vez que lhe delegavam algum trabalho respondia tão-somente: "Preferia não o fazer".
Bartleby é o sujeito que parou de escrever. E Enrique Vila-Matas, que só faz escrever, é o sujeito que multiplicou os Bartlebys.
Em "Bartleby e Companhia", um dos livros mais originais da década, e que sai agora no Brasil pela editora Cosac Naify, o escritor catalão de 56 anos narra a história de um burocrata que, 25 anos depois de publicar seu único e malsucedido romance, resolve voltar a escrever.
O narrador não se atreve a escrever novamente um romance. Põe-se a compilar notas de rodapé para um livro sobre o que batiza de "Síndrome de Bartleby".
Elenca, então, em 86 notas casos de autores que pararam subitamente de escrever, como o emblemático J.D. Salinger, ou que de algum modo disseram não às letras.
Um dos principais nomes da literatura em espanhol e destaque mundial da ficção "inventiva", Vila-Matas é a primeira estrela confirmada da 3ª Festa Literária Internacional de Parati, em julho.
A Folha telefonou para a casa dele em Barcelona, na quarta-feira, pedindo uma entrevista. Felizmente, Vila-Matas não seguiu o lema de Bartleby; não disse o "Preferia não o fazer".
 

Folha - O sr. disse em entrevista à Folha no ano passado que, quando escreveu "Bartleby", não conhecia o drama de não escrever. O sr. se questionava se valia a pena continuar escrevendo. Vale?
Enrique Vila-Matas -
Quando disse, pensava que todas as vezes que escrevo um livro com um tema bem concreto sempre tenho, ao terminá-lo, a percepção de que poderia ter me aprofundado mais. Livros como esses seguem sua vida própria. Não tinha consciência quando escrevi "Bartleby" de que haveria um grupo grande de leitores que se identificaria com os Bartlebys, pessoas que tinham o desejo de escrever, mas nunca o realizaram, que tinham escrito alguma vez, mas não publicado, e assim por diante. Apareceram diversos Bartlebys em todos os países onde o livro saiu.


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