São Paulo, sexta, 29 de janeiro de 1999

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"Guinevere' é "Pigmalião-99'

AMIR LABAKI
enviado especial a Park City (EUA)

O drama romântico "Guinevere", de Audrey Wells, pousou no Sundance-99 como a principal carta da distribuidora Miramax na competição ficcional.
Um letreiro de abertura celebra os 20 anos da casa dos irmãos Weinstein, cuja ascensão na cena independente (apesar da vinculação ao grupo Disney) praticamente coincide com a do próprio festival.
"Guinevere", contudo, foi logo ofuscado pela vitória da Miramax no leilão por "Happy, Texas", de Mark Illsley, uma comédia policial envolvendo no vilarejo do título um casal de criminosos e um policial, todos gays. Derrotados na disputa falam num preço recorde pelos direitos em torno de US$ 10 milhões. A Miramax reconhece apenas um acordo por volta de US$ 2,5 milhões mais participação na bilheteria para os produtores a partir da venda do primeiro ingresso.
O melodrama de Wells, uma roteirista estreando na direção, parece um produto de menor risco. É um "Pigmalião" versão 99, com Stephen Rea ("Traídos pelo Desejo") como o mentor e a Sarah Polley ("O Doce Amanhã") fazendo a bela pupila.
Não são Bernard Shaw nem sequer William Wyler ("Minha Bela Dama") as referências básicas. Wells parece inspirar-se mais no Adrian Lyne ("9 e Meia Semanas de Amor"). San Francisco poucas vezes viu assim revelada sua porção yuppie.
Polley faz Harpey, a caçula de uma abonada família de advogados. Um curso em Harvard seria seu destino não fosse o encontro com o boêmio fotógrafo Cornelius (Rea), "Connie" para os íntimos, na festa de casamento da irmã. Segue-se uma edição da velha história da troca do entediante conforto da vida burguesa pelas aventuras do mundo artístico, com Harpey rebatizada de Guinevere pelo mestre-amante.
É claro que ela logo descobre ser mais uma a ocupar o posto de jovem discípula de Connie. Embalado por muito jazz latino, bossa-nova inclusive, a relação cumpre seu ciclo. Rea faz o que pode para escapar da armadura beat-chique de seu personagem, enquanto Polley dá conta com facilidade das limitações de Guinevere.
Ponto para você se lembrou do episódio "Lições de Vida", de Martin Scorsese, para "Contos de Nova York" (1989). Se o esquematismo lá já incomodava, imagine aqui nesta pálida imitação. "Guinevere" pode até vir a fazer dinheiro, mas nada tem a ver com a ousadia que se procura no Sundance. Mais que um filme a ver, eis um exemplo a se estudar.
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O crítico Amir Labaki está em Park City como jurado da competição latino-americana



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