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Salvação pela doença
da Equipe de Articulistas
Quando o cinemão americano não sabe o que fazer para arrancar lágrimas, apela para o
câncer. Em "Lado a Lado", a
fórmula está de volta, requentada e misturada com outro
mote que dá muito Ibope em
Hollywood, o da separação de
um casal com filhos.
Claro que a separação não
pode mais ser tratada com o
moralismo de dramalhão mexicano de um "Kramer x Kramer". Como as novelas da Globo, os filmes americanos "sabem" que têm de mudar para
continuar iguais.
E "Lado a Lado", ao que parece, atingiu em cheio a sensibilidade do espectador americano
médio -ou da espectadora,
pois esse é, dizem, um filme para mulheres. Conseguiu isso
graças a um roteiro e uma produção milimetricamente calculados para afastar qualquer risco ou ousadia.
O desenho do filme é claríssimo. Há uma mãe tradicional,
Jackie (Susan Sarandon), que
tinha um emprego tradicional
(era editora de livros), veste-se
de maneira tradicional, cria
seus filhos -Anna (Jena Malone) e Ben (Liam Aiken)- de
modo tradicional e mora numa
casa tradicional, com varanda,
balanço e gramado.
Seu ex-marido, o advogado
Luke (Ed Harris), passa a viver
com uma mulher mais jovem,
Isabel (Julia Roberts), que tem
um emprego "moderno" (é fotógrafa de moda), veste-se de
modo "moderno", ouve música "moderna" e se relaciona de
um modo "moderno" com os
filhos do namorado.
Esse desequilíbrio entre os
dois mundos é um fator de perturbação para as crianças -sobretudo para a pré-aborrecente
Anna, que move uma guerra
contra sua "madrasta".
Como resolver o impasse?,
perguntam-se os roteiristas,
produtores e executivos do estúdio. Até que alguém tem a
idéia: e se a mãe tivesse câncer?
Claro, como não pensamos
nisso antes? Acaba a briga entre
as mulheres, as crianças têm
uma lição de vida, o pobre Luke
deixa de se sentir dividido, o
novo substitui o velho sem necessidade de conflito. E o que é
melhor: todo mundo chora.
Alguém deveria fazer um estudo sobre a tendência hollywoodiana de esvaziar -graças
à intervenção de um fator externo, inevitável- o sentido
ético das opções humanas.
Em Hollywood, o câncer purga, exorciza, liberta, engrandece, supera as diferenças, humaniza. O câncer salva, enfim.
Talvez isso seja sintoma de
uma sociedade imatura, talvez
seja só um jeito de ganhar dinheiro "honestamente".
É famosa a frase do Galileu de
Bertolt Brecht: "Infeliz o país
que precisa de heróis". Diante
dos melodramas americanos,
podemos pensar: "Infeliz o país
que precisa do câncer".
Uma curiosidade do filme é
que Anna joga futebol (o "nosso", não o americano), esporte
muito mais popular entre as
meninas do que entre os meninos nos EUA.
E Susan Sarandon (produtora
executiva do filme, ao lado de
Julia Roberts) se especializa no
papel de "mater dolorosa". Ela
já foi, acredite, uma mulher
sexy, engraçada e inteligente.
Mas isso não dava Oscar.
Em tempo: o diretor Chris
Columbus fez antes as comédias "Esqueceram de Mim" e
"Uma Babá Quase Perfeita".
(JOSÉ GERALDO COUTO)
²
Filme: Lado a Lado
Produção: EUA, 1998
Direção: Chris Columbus
Com: Julia Roberts, Susan Sarandon
Quando: estréia hoje, nos cines Astor,
Paulista 2 e circuito
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