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"VOU SER FELIZ E JÁ VOLTO"
Artista faz show com canções solo e do conjunto
Titã "invasor", Miklos libera agressividade no palco
DA REPORTAGEM LOCAL
Festejado por sua interpretação em "O Invasor", novo
filme de Beto Brant, o titã Paulo
Miklos, 43, está em fase de bola
cheia. Sincronizando os transistores, regulou as pré-estréias do filme com dois shows solo no Sesc
Vila Mariana, na quarta e ontem.
O objetivo era mostrar o repertório de seu disco próprio "Vou
Ser Feliz e Já Volto" (2001), mais
rocks e baladas antigos (de "Paulo
Miklos", o primeiro solo, de 94) e
um ou outro sucesso dos Titãs.
O clima era mínimo e acústico
-ele ao violão, Simone Soul na
percussão, Clara Bastos no contrabaixo. Inflado por prêmios e
elogios por "O Invasor", Miklos
parecia querer fazer valer o lema
de "vou ser feliz sem os Titãs e já
volto". Fez valer, mas nada escondeu o fato de que o público, mesmo dócil, não está adaptado à
idéia de felicidade de Miklos.
A persona que simulava era a do
o invasor do filme, um matador
de aluguel agressivo e meigo de
uma vez só, que cospe na cara de
todos o tempo todo, mas é todo
amoroso em sua truculência.
Na primeira canção, "De Quem
São as Cidades?" (94), iniciou de
mansinho, mas já provocando:
"Nem os incomodados se mudam/ nem mudam os que costumam incomodar". Era a doutrina
do invasor: nem te ligo, mas jogo
cascalho pontudo no seu caminho e poeira nos seus olhos.
Em "Aos 500 Surfistas Rodoviários Mortos" (94), encenou rock
de protesto de descascar ferida:
"Os surfistas rodoviários/ já estavam mortos quando subiram".
Em "Diversão" (87), dos Titãs, o
iluminador perturbava a platéia,
ofuscando-a para obrigá-la a cantar o refrão. O desconforto subia,
mas não pertencia ao invasor.
"Ele Vai Se Vender" (94) cutucava a maldição do pop star, ainda que o invasor se protegesse em
parte pelo uso da terceira pessoa.
Vinha "Flores" (89), e a iluminação atormentava de novo os invadidos, incitando-os a cantar as
flores de plástico que não morrem. Aí anunciou um "pot-pourri
do desamor", e se soltou. Os erros
e lapsos de trechos inteiros de letras já vinham acontecendo, mas
agora era explícito, um horror.
Emendou com "É Preciso Saber
Viver", de Roberto e Erasmo, forçando uma galera teen a subir ao
palco e fazer micagens sobre o baladão carola. Aí já era certo que o
show do invasor era uma elegia à
imperfeição e ao anticlímax.
"Sinos Entre os Anjos" (2001)
começava com o verso "estou
aqui sem chamar muito a atenção", delírio de quem chamava
muita atenção, tal qual matador
namorando a filha dos assassinados. Só faltava o bis, de discursos
sobre "reality shows", "Comida"
(87) e "Sonífera Ilha" (84), ameaças falsas de deixar o palco e voltas assim não muito desejadas, jogos sadomasoquistas de provocação, frases cuspidas de "põe a culpa em mim, põe".
O público? Aplaudiu de pé, sim.
Os invadidos não se sentiram invadidos, ou não se demonstraram, mesmo que não se ajeitassem à felicidade feia, suja e malvada do artista. Miklos foi-se embebido em seu personagem anarquizado e anarquizador, que talvez nem seja diferente do que ele
já desempenhou entre os Titãs.
Seu show solo aparecia, enfim,
como projeto de antídoto ao bom
comportamento, ao profissionalismo e ao excesso de regras que
domaram os Titãs. Sozinho e incompleto, podia usar e a abusar
da liberdade que o tempo e a profissionalização lhe impuseram.
O invadido, afinal, era ele. Os invasores, enfim, éramos os espectadores. E ele e nós fomos embora
qual ovelhas dum grande rebanho.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
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