São Paulo, sexta-feira, 29 de abril de 2005

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Político ficou refém de grupo radical por 55 dias

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

A Itália e boa parte do planeta prenderam a respiração nos 55 dias em que Aldo Moro (1916-1978) permaneceu refém das Brigadas Vermelhas, grupo terrorista da extrema esquerda italiana, que finalmente o matou e abandonou seu corpo no porta-malas de um Fiat no centro de Roma.
Catedrático em direito na Universidade de Bari, duas vezes primeiro-ministro (1963-68 e 1974-76), era o mais erudito e respeitado dirigente da Democracia Cristã, partido de centro-direita e hegemônico na política italiana do pós-guerra.
Ele tinha uma espécie de "alma gêmea" na Itália partidária dos anos 70: Enrico Berlinguer, descendente da nobreza da Sardenha e secretário-geral do Partido Comunista Italiano.
Os 30 anos de polarização entre a DC e o PCI impediam uma solução consensual para um Estado em crise e incapaz de dialogar com a sociedade sem o apelo ao clientelismo.
Berlinguer (1922-1984) propôs como fórmula para a saída da crise endêmica o chamado "compromisso histórico", pelo qual os comunistas e os democrata-cristãos assumiriam conjuntamente o governo em nome de um projeto de democracia que arejasse o Estado e o tornasse capaz de responder às demandas sociais.
Moro e Berlinguer não chegaram a colocar a idéia em prática. Foram violentamente bombardeados por seus respectivos agregados radicalizados ou apegados à geopolítica da Guerra Fria.
O democrata-cristão foi veladamente ameaçado por Henry Kissinger, secretário de Estado americano, em razão do plano de convidar os comunistas para integrar o gabinete. O comunista, por sua vez, enfrentou dissensões (deixou o partido a ala esquerda, que se articulou no grupo Il Manifesto, enquanto uma parcela da extrema esquerda - possivelmente não mais que 500 clandestinos- optou pela luta armada e criou as Brigadas Vermelhas).
As brigadas seqüestraram Moro em 16 de março de 1978, quando, ao deixar sua casa, ele percorria com cinco guarda-costas a via Fani e se dirigia à Câmara dos Deputados, onde pela primeira vez o PCI aprovaria um gabinete liderado por um primeiro-ministro da DC, no caso, Giulio Andreotti.
As brigadas, lideradas pelo maoísta Renato Curcio, já estavam sendo desmanteladas numa eficaz operação judicial e de inteligência. Os seqüestradores ameaçaram matar o refém caso seus presos não fossem soltos.
Cumpriram a ameaça, apesar das intervenções de lideranças italianas de todos os quadrantes e até do papa Paulo 6º, um amigo pessoal do seqüestrado.
Anos depois, Berlinguer, um amante de poemas e filosofia, morreria de câncer. O Partido Comunista mudou de nome. Chama-se hoje PSD (Partido da Esquerda Democrática). A DC se desestruturaria em meio a acusações de corrupção durante a "operação mãos limpas", desencadeada pelo Poder Judiciário em Milão.


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