São Paulo, terça-feira, 29 de maio de 2001

Texto Anterior | Índice

Disco fala mais ao cérebro do que à cintura

EDSON FRANCO
DA REDAÇÃO

Coube à menos idosa estrela da turma de músicos da velha-guarda cubana resgatada pelo projeto "Buena Vista Social Club", o baixista Orlando "Cachaíto" Lopez, 68, a tarefa de acabar com o embargo criativo que já tomava conta do bando de velhinhos competentes.
Esse sopro de vida nova na música de Cuba está registrado em "Cachaíto", CD que a Warner lança no Brasil.
Não há ali nenhuma saída facilitadora como as que têm sido usadas, por exemplo, pelos cantores Ibrahim Ferrer ou Omara Portuondo. Em vez de pegar clássicos dos anos 40 e executá-los precisamente, com a ajuda de um time de bambas, o baixista abre seus ouvidos para sonoridades de fora da ilha e as funde com a sua herança musical, que não é pouca.
Ele é filho de Orestes -que, com o maestro Arsenio Rodriguez, ajudou a "escrever" o manual do mambo- e sobrinho de Israel -mais conhecido como Cachao, figura central no desenvolvimento da descarga, o improviso cubano.
Pois bem, Cachaíto usa seu baixo redondo, reticente e sólido para emoldurar uma música que, apesar de inconfundivelmente cubana, flerta com -e sobrevive a - reggae, rhythm and blues, jazz, hip hop e música eletrônica.
Diferentemente de seus antecessores, esse CD não tem o intuito de fazer o ouvinte saracotear pela sala. É mais climático que pulsante. Fala mais ao cérebro que à cintura.
São 12 faixas para quem ouve sem preconceito um músico cubano cuja mais forte influência é o baixista de jazz norte-americano Charles Mingus (1922-79), citado explicitamente na música "Tumbao nš 5". Nela, Cachaíto repete várias vezes uma frase de "Haitian Fight Song", composição de Mingus.
Tutor e curador das ousadias que permeiam o CD, o produtor Nick Gold não economizou em efeitos como eco e reverberação para revestir de inquietude músicas como "Tumbanga" ou ampliar a atmosfera intrigante de "Anais".
Para os aficionados pela música da velha-guarda cubana que esperavam mais do mesmo, o CD reserva apenas a faixa "Wahira", que, para reforçar seu apelo mercadológico, conta com a voz frágil e incisiva de Ibrahim Ferrer.
O resto é experimentação. Apesar de carecer de um pouco mais de maturação, as idéias lançadas por Cachaíto nesse CD têm potencial para desfossilizar a música cubana. Com ele, o baixista força os demais velhinhos a criarem o novo.


Cachaíto
   
Artista: Orlando "Cachaíto" Lopez
Lançamento: Warner
Quanto: R$ 25, em média




Texto Anterior: Cuba sem fronteira
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.