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São Paulo, quinta-feira, 29 de maio de 2003

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MEMÓRIA

Berio transitou entre ópera, música popular e folclore

PAUL GRIFFITHS
DO "NEW YORK TIMES

Luciano Berio foi compositor de trabalhos -que variam de música de câmara a peças orquestrais em grande escala e de óperas a canções- que combinavam imaginação inovadora e profundidade analítica.
Um notável compositor vocal e orquestral, talvez mais conhecido por seus trabalhos para voz solo, Berio ganhou fama especial durante sua residência em Nova York por reger o Juilliard Ensemble, que ele fundou.
O amor de Berio pela música o aproximou da ópera italiana (Monteverdi e Verdi), do modernismo do século 20 (Stravinsky), da música popular (Beatles, jazz), dos grandes sinfônicos do romantismo (Schubert, Brahms, Mahler) e de canções folclóricas.
Berio nasceu em uma família de músicos estabelecida na cidade de Oneglia, na costa da Ligúria. Após a Segunda Guerra, ele entrou no Conservatório de Milão, onde estudou composição com Georgio Federico Ghedini, cujo estilo neo-barroco serviu de influência.
Entre seus colegas de conservatório estava a soprano norte-americana Cathy Berberian, com quem se casou em 1950 e na companhia da qual visitou os EUA, onde conheceu Luigi Dallapiccola, em Tanglewood, e a cena da música eletrônica experimental de Nova York. Sob essas influências, se tornou um modernista com composições como "Música de Câmara" (1953). Um encontro com o italiano Bruno Maderna o levou à escola Darmstadt, o ponto de encontro para a vanguarda européia, na Alemanha. Berio produziu notáveis concepções, como "Tempi Concertati".
Outros trabalhos do período incluem suas primeiras peças eletrônicas. Ele co-dirigiu, com Maderna, um estúdio de música eletrônica em uma rádio italiana de Milão, e lá produziu um dos primeiros clássicos da música de fita, "Thema (Ommagio a Joyce)" (1958). No mesmo ano, com "Sequenza I", instituiu uma série de estudos, cada qual levando em consideração a história, o desempenho, o estilo e a aura de um instrumento. Até sua morte, compôs 14 dessas peças, para a maior parte dos instrumentos ocidentais.
A primeira composição de Berio para o teatro, "Passagio", estreou em 63. Mais tarde, seus trabalhos dramáticos se tornaram mais poéticos que políticos. "Laborintus II" (65) se baseia em um poema anticapitalista.
Entre 63 e 71, Berio viveu principalmente em Nova York, com Susan, sua segunda mulher. Lecionou na Juilliard School, onde se tornou mais ativo como regente. Escreveu "Sinfonia" e sua primeira ópera completa, "Opera".
Em 72, Berio voltou à Itália. Na metade dos anos 70, se tornou co-diretor do instituto de música computadorizada de Boulez em Paris, posto que deixou em 80.
O maior trabalho de Berio na década posterior a "Opera" foi "Coro", tessitura de melodias inspiradas em canções folclóricas com arranjos corais para versos de Neruda. A seguir, voltou à ópera, com colaborações envolvendo o escritor Italo Calvino: "Una Vera Storia", e "Un Re in Ascolto".
Ambas as peças, como "Opera", representavam desconstruções do gênero. A primeira parte de "Una Vera Storia" é uma análise teatral de "Il Trovatore", de Verdi, a segunda uma nova síntese dos elementos dramáticos e musicais encontrados. "Un Re in Ascolto" (96), retrabalha parte de "A Tempestade", de Shakespeare, em uma forma na qual ensaio, execução e memória coalescem.
A narrativa se dissolve ainda mais em "Outis" (96), que se baseia no mito de Ulisses e incorpora imagens de genocídio do século 20. A preocupação com a temática judaica em óperas foi estimulada por sua terceira mulher, Talia Packer Berio, nascida em Israel. Ela criou o libreto de "Cronaca del Luogo", e também chamou a atenção do marido para os esboços sinfônicos de Schubert.
Outros trabalhos orquestrais tardios, como "Formazioni" (1985/7) e "Concerto II" para piano solo (1988/90), mostram a habilidade de Berio para descobrir novas maneiras de permitir que a orquestra fale de maneira vívida e bela, enquanto os instrumentos solo continuam a ter espaço, com a ampliação da série "Sequenza". Mas talvez sua realização mais pessoal e poderosa sejam os trabalhos para voz feminina, de "Música de Câmara".


Tradução Paulo Migliacci


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