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São Paulo, quinta-feira, 29 de maio de 2003

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CRÍTICA

"Realidade" põe em risco fábula de "O Jogo"

XICO SÁ
CRÍTICO DA FOLHA

Para descansar um pouco dos Jecas sem nenhum caráter que aprenderam a fórmula da vitória dos "Big Brothers", brincar de detetive pode até ser mais lúdico e menos entediante. "O Jogo" -novo "reality show" da Globo- põe mais um bando de doentes por fama e dinheiro na roda. Mas quem não é? -indagaria em uníssono a nação. Pipoca, please, vida, o filme, continua.
Uma pena é que a turma parece não ter tomado direito nem mesmo as lições básicas de titia Agatha Cristhie. Talvez esteja mais preocupada em provocar a dita alteridade de que tanto falam os sociólogos. Agora é diferente. Os candidatos são torturados com um drama fictício à "Linha Direta". Precisam descobrir os rastros de um terrível assassino.
Terrível para a outrora pacata e graciosa Vila de Santo Antônio, cidade imaginária localizada no sul do país. Antigamente se matava assim, como nos livros de Agatha, por alguma intriga ou motivo demasiadamente humano. Para o telespectador que vive o pânico de SP, o crime chega a ter um estranho cheiro de nostalgia. Ora, ainda mais para quem acompanha os programas policiais e já transformaram em circo e entretenimento a carnificina real.
Mas nesse tom quase de fábula de Esopo, bem narrada por Zeca Camargo, de poética mais econômica do que o samba-exaltação de Pedro Bial -condutor do "BBB"-, "O Jogo" segura a brincadeira proposta aos concorrentes e à cordial família escrava do sofá.
O texto é respeitoso aos velhos clichês dos romances do gênero. O que é uma vantagem a mais para a brincadeira. A direção diz a todo instante que os candidatos não passaram por ensaios, estão ali a cru, como um não-ator de Grotowski, o polonês que preferia um teatro sem os vícios dos profissionais.
O pior é que o êxito do programa depende justamente da desenvoltura desses sujeitos. Essa suposta falta de ensaios e/ou a mediocridade dramática de fato dos participantes, que seguram a onda no modelo "BBB", podem travar a graça da história, por mais que a ficção dos Klein esteja envolvente. É o risco elementar da mistura de drama com "vida real". Ainda mais em tempos de novela em alta, como no caso da das oito, na qual as mulheres trocam a velha D.R. (discussão de relação) por uma boa peixeirada no consorte vagabundo.
Se tudo der errado, no entanto, ainda teremos aí, por baixo, por baixo, uma concorrente na capa de "Playboy" e uns bons ensaios de sites eróticos. A moral de vida, o filme, é sempre essa.


O Jogo   
Quando: terça, às 22h30, na TV Globo



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