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CRÍTICA
Autor se entrega ao livro com disposição punk
DA REDAÇÃO
Uma pequena Alice escapa de casa e mergulha em
um outro mundo. Desta vez,
não no país das maravilhas
nem através do espelho, e, sim,
num território de horrores,
movido a pornografia letal e no
qual a rainha de copas é substituída por Eva K., mãe, linda,
loura, gélida e serial killer.
"A Sereia Vermelha", estréia
de Maurice G. Dantec na ficção
e primeiro livro do autor publicado no Brasil, não tenta escapar das convenções da chamada literatura de entretenimento. É livro movido a adrenalina,
daqueles que a gente abre para
espantar a insônia e passa o
resto da noite em claro.
Ao contrário de seu contemporâneo e compatriota Michel
Houellebecq, Dantec não se
compraz no comentário sociopolítico. Lança seus personagens nos meandros da atualidade histórica como se fossem
dados e cruza os dedos para
que eles não saiam muito chamuscados desse inferno já em
chamas.
A admiração do autor pelos
filmes de John Woo é explícita
na fuga de Alice através dos
horrores da Europa, mas não é
só. A deriva Ballard de seu texto
é que torna essa estréia mais do
que estimulante, promissora.
Como Ballard, legítimo herdeiro futurista de um certo
marquês de Sade, a perversão
serve de pedra de toque para a
ficção, que vem entupida de
mensagens subliminares. Deus
está morto, o pai é um eterno
ausente, a lei não passa de formalidade e qualquer ultrapassagem não só é admitida como
estimulada.
Eva K. é mulher bifronte, ao
mesmo tempo executiva reverenciada no "grand-monde" e
produtora e protagonista de
snuff movies (espécie de pornografia extrema na qual em
vez de sexo explícito se oferecem assassinatos explícitos).
Do outro lado do crime, Hugo Vornelius Toorop, um mercenário que atuou de modo
obscuro na Guerra dos Balcãs,
aguarda em Amsterdã instruções para novas missões quando os cabelos louros dessa nova
Alice cruzam seu caminho.
Mistura de Chapeleiro Louco
e coelho, Hugo é menos um herói que testemunha impávida
de catástrofes incessantes. O
apocalipse bate à porta, e a Europa, saturada de humanismo,
convida-o amigavelmente a
entrar. E ainda estávamos em
um longínquo 1993.
Dantec se meteu nessa aventura literária com a mesma disposição que um punk empunha seu instrumento musical.
Apesar do barulho que faz incomodar muitos, é impossível
ignorar sua delirante lucidez.
(CÁSSIO STARLING CARLOS)
A Sereia Vermelha
Autor: Maurice G. Dantec
Tradutora: Vera Lucia dos Reis
Editora: Objetiva
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