São Paulo, quinta-feira, 29 de agosto de 2002

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59ª MOSTRA INTERNACIONAL DE VENEZA

Bandeira Branca


Dirigido por Moritz de Hadeln, Festival de Veneza, que começa hoje, quer ser "ilha de neutralidade"


ALCINO LEITE NETO
DE PARIS

Após ter se transformado num dos fronts da luta entre direita e esquerda na Itália, o festival de cinema de Veneza quer ser agora uma "ilha de neutralidade e independência" -como a Suíça.
Esse é o sonho do novo diretor da Mostra Internacional de Arte Cinematográfica, Moritz de Hadeln, 62, ele próprio um suíço e o primeiro estrangeiro a assumir o cargo nos 70 anos de existência do festival, fundado em pleno regime fascista de Mussolini.
A Mostra de Veneza começa hoje, com a exibição do aguardadíssimo "Frida", de Julie Taymor, e anuncia o vencedor do Leão de Ouro em 8 de setembro.
De Hadeln, que dirigiu o Festival de Berlim durante 22 anos, aceitou o cargo em Veneza no final de março. Desde janeiro, a Mostra de Veneza estava sem capitão e sem rumo, depois que Alberto Barbera renunciara, em protesto contra a política cultural do governo de direita do primeiro-ministro Silvio Berlusconi.
Ao aceitar o cargo, De Hadeln foi bombardeado por críticas. À direita, por ser um estrangeiro. À esquerda, acusado de cortejar Hollywood e o "mainstream" cinematográfico, em detrimento das produções periféricas. Fez o festival em tempo recorde de menos de cinco meses.
Apenas um filme brasileiro participa do festival: "Rocha que Voa", de Erik Rocha, sobre o exílio em Cuba, nos anos 70, de seu pai, o cineasta Glauber Rocha. "O cinema brasileiro é muito interessante, mas nem sempre é um cinema muito internacional", opina De Hadeln na entrevista a seguir. Leia trechos.

Folha - Que dificuldades enfrentou ao assumir o festival?
Moritz de Hadeln -
As primeiras semanas foram difíceis, por causa das reações pela escolha de um não italiano. Mas rapidamente, por sorte minha, muitos italianos que me conheciam de Berlim se manifestaram para dizer que eu não era um estranho, que eu não tinha chegado da Lua.

Folha - O sr. tem simpatia pela política de Berlusconi?
De Hadeln -
Sendo um estrangeiro na Itália e um suíço, eu sou muito neutro. Tenho minhas próprias opiniões políticas, mas as guardo para mim. Espero que o festival seja uma ilha de neutralidade e independência.

Folha - O sr. acha que a sua seleção é representativa da produção internacional?
De Hadeln -
Não sei. Creio que há um ponto fraco, que é o cinema latino-americano, particularmente o Brasil.

Folha - Por que há apenas um filme brasileiro?
De Hadeln -
Queríamos mais filmes, mas o que encontramos não correspondia à nossa expectativa. Não se trata de um julgamento sobre a qualidade dos filmes. Eles apenas não estavam prontos no momento certo. Estive muito envolvido com o cinema brasileiro no passado e sei que há novos diretores com talento, mas eles não fazem um filme a cada ano. O cinema brasileiro é muito interessante, mas nem sempre é um cinema muito internacional.

Folha - Os filmes europeus são suficientemente internacionais?
De Hadeln -
Não. O único país que tem uma produção regular de filmes mais voltada para o mercado internacional é a França. Faltam verdadeiros produtores. A grande diferença entre os EUA e a maioria dos países europeus é que os americanos têm uma língua unificada e um enorme público potencial para seus filmes. O que não é o caso da maioria dos países europeus. É muito difícil um filme sobreviver apenas do mercado interno de um pequeno país.



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