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CINEMA
Dramaturgo e roteirista americano escreveu clássicos como "O Homem Que se Vendeu' e "Contrastes Humanos'
Centenário de Sturges vê falência da comédia
AMIR LABAKI
de Nova York
Preston Sturges (1898-1959) se
divertiria com o contraste entre as
celebrações de seu centenário de
nascimento, amanhã, e a inequívoca decadência da comédia cinematográfica americana.
Nada mais distante do humor
rasteiro e escatológico de sucessos
recentes como "There's Something about Mary" do que a sofisticação e ironia de clássicos quase
esquecidos como "O Homem
Que se Vendeu" (1940) e "Contrastes Humanos" (1942).
Nascido em Chicago sob o nome
de Edmund Preston Biden, Sturges protagonizaria uma saga similar à de seus personagens. Criado
entre Chicago e Paris por sua mãe
coquete e um padrasto, Sturges
desde cedo temperou seu olhar sobre o "sonho americano" com a
"joie de vivre" da aristocracia
cultural européia. Sua mãe e Isadora Duncan eram inseparáveis.
O jovem Sturges tentou ganhar a
vida como inventor. Não foi muito
longe, tendo por maior criação
um batom que não saía com beijos. Uma providencial apendicite,
em 1927, prendeu-o à cama. Aproveitou o tempo para escrever.
"Speaking of Operations" (Falando de Operações), sua primeira
peça, jamais chegou ao palco, graças à autocrítica do autor: "Não
demorei a perceber que havia sido
concebida e executada sob uma
nuvem de anestesia".
As coisas seriam diferentes com
os textos seguintes. Sua terceira
comédia, "Strictly Dishonorable" (1929), alcançou sucesso na
Broadway e pavimentou-lhe o caminho para Hollywood. Sturges
começou redigindo diálogos, mas
logo conseguiria ver filmados seus
roteiros completos.
"The Power and the Glory"
(1933) estabeleceu o padrão. Uma
intrincada estrutura em
flash-backs apresenta em tom cômico a ascensão e a queda de um
magnata de ferrovias. Nascia o
"Frank Capra sem luvas", na definição de Raymond Durgnat.
Os filmes de Sturges, que não demoraria a também dirigir, são fábulas irônicas sobre a obsessão pelo sucesso. Têm a dimensão social
de "A Mulher Faz o Homem"
(1939) ou "Adorável Vagabundo" (1941), mas não seu otimismo. Todos são, também, como assinalou André Bazin, "a exploração de um mal-entendido".
Sturges concentrou-se sempre
em poucos personagens, que formam um microcosmo americano.
Uma situação básica serve de
combustível para o filme. Sua arte
é a da criação de enredos com uma
confusão básica por meio de alguns dos mais primorosos diálogos já escritos para as telas.
Seu período áureo se deu curiosamente em plena guerra. Entre
1940 e 1944, Sturges emplacou sete
obras-primas em sequência -nenhuma delas exatamente exaltatória do heroísmo ianque. Abre o lote "O Homem Que se Vendeu",
em que um espertalhão alia-se a
um gângster para ascender politicamente -e despenca quando decide agir com honestidade.
Encerra-o "Herói de Mentira",
na qual um grupo de militares
monta uma farsa para que um pobre coitado dispensado do Exército volte para casa sem desonrar a
memória heróica do pai.
Entre um e outro, um monumento chamado "Contrastes Humanos" ("Sullivan's Travels",
1942). Um cineasta de sucesso
(Joel McCrea) decide abandonar
as comédias e dedicar-se à grande
arte do drama social.
Disfarça-se de vagabundo para
conhecer pessoalmente o cotidiano dos miseráveis. A pesquisa assume ares trágicos ao ser preso e
condenado a trabalhos forçados,
descobrindo então a nobreza
maior do humor. Era o testamento
precoce de Sturges.
O ESTILO
REGRAS
"As regras de ouro de uma comédia de sucesso:
- Uma garota bonita é melhor
do que uma comum.
- Uma perna é melhor do que
um braço.
- Um quarto é melhor do que
uma sala.
- Uma chegada é melhor do
que uma partida.
- Um nascimento é melhor
do que uma morte.
- Uma perseguição é melhor
do que uma conversa.
- Um cão é melhor do que
uma paisagem.
- Um gatinho é melhor do
que um cão.
- Um bebê é melhor do que
um gatinho.
- Um beijo é melhor do que
um bebê.
- Um tombo é melhor do que
tudo."
DIÁLOGOS
"Esta é uma das tragédias da
vida: os homens que merecem
apanhar são sempre enormes"
(trecho de diálogo em "Mulher de Verdade").
"O cavalheirismo não está
morto, está em decomposição" (idem).
"Nada é eterno neste mundo,
querida, exceto (o presidente)
Roosevelt" (idem).
"Há muito a ser dito sobre fazer as pessoas rir. Você sabe
que isso é tudo que algumas
pessoas têm?" (em "Contrastes Humanos").
A OBRA
1940 - "O Homem Que se
Vendeu" ("The Great
McGinty")
"Natal em Julho" ("Christmas in July")
1941 - "As Três Noites de
Eva" ("Lady Eve")
1942 - "Contrastes Humanos" ("Sullivan's Travels")
"Mulher de Verdade"
("The Palm Beach Story")
1944 - "Papai por Acaso"
("The Miracle of Morgan's
Creek")
"Herói de Mentira" ("Hail
the Conquering Hero")
"Triunfo sobre a Dor"
("The Great Moment")
1946 - "Trapalhadas de Haroldo" ("Mad Wednesday")
1948 - "Infielmente Sua"
("Unfaithfully Yours")
1949 - "Esta Loura É um Demônio" ("The Beautiful
Blonde from Bashful Bend")
1955 - "Les Carnets du Major Thompson" ("As Memórias do Major Thompson")
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