São Paulo, sexta-feira, 29 de setembro de 2000

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"Brasil é periférico", diz Piñon


ESPECIAL PARA A FOLHA

Nestes anos todos em que o Brasil tem estado isolado de seus vizinhos latino-americanos, a escritora Nélida Piñon tem atuado como uma espécie de diplomata informal das relações do país com a hispanidade. Não por acaso, será ela a representante brasileira, entre os escritores, no 1º Fórum Ibéria e América Latina.
Piñon, que passa a maior parte do tempo viajando, falou à Folha, pelo telefone, de sua casa nos Estados Unidos -há dez anos, por um semestre, ocupa uma cadeira da Universidade de Miami, a mesma do Nobel de Literatura de 1978, Isaac Singer (1904-1991).
Leia a seguir trechos da entrevista. (CM)

Folha - A sra. é uma militante da integração, não é?
Nélida Piñon
- É que, desde muito jovem, via que não somente nós nos desconhecemos, sobretudo o mundo luso e o mundo hispano, como também percebia que, toda vez que se falava de América Latina, nunca se mencionava o Brasil. Lutei muito, já em 1970 eu batalhava, para incluir o Brasil nessa designação geral.
Hoje é difícil que se faça um fórum ou algo sobre a América Latina e não se inclua o Brasil. Não havia intenção de alijar, era uma impossibilidade de entender que esse país continental, oficialmente com uma cultura e língua diferentes, fizesse parte de um princípio básico e que tivéssemos destinos comuns.

Folha - Em termos de literatura, isso já mudou?
Piñon
- Muito ainda não. Acho que melhorou muito. O Carlos Fuentes, que está à frente desse fórum, tem uma noção perfeita da necessidade de integração. Quando digo integrar não é renunciar às diferenças, que são razão de riqueza da humanidade. Mas quando você abre os olhos, legitima o outro. De olhos fechados o outro não existe.

Folha - Esse tipo de encontro funciona?
Piñon
- Todo debate é útil. Não sabemos até que ponto vão os debates, como se propagam nessa rede cultural do mundo, que é tão vasta. Mas no momento que você dá nome às coisas, elas passam a existir. Quem sabia isso mais que qualquer pessoa era Deus. No Gênesis, está lá: no princípio era o verbo. O mundo precisa cada vez mais entender que a América Latina é um conjunto histórico, de culturas, que não pode ficar fora dos epicentros. Nós somos epicentro. Não podemos continuar com esse sentimento periférico.

Folha - O Brasil é epicentro ou periferia?
Piñon
- Eu acho o Brasil extremamente periférico. Não que mereçamos, mas é a realidade. A nação brasileira precisava fazer um esforço imenso no sentido de se dar a conhecer. Viajo bastante e vejo que não somos muito conhecidos, não se escreve nada sobre o Brasil. A idéia que perdura é a do gigante. Só que não se conhece o conteúdo do gigante.


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