São Paulo, sexta-feira, 29 de setembro de 2000

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Em "O Homem sem Sombra", Paul Verhoeven conta a história de cientista que fica invisível
Perversidade visível

Divulgação
O invisível Sebastian Caine (Kevin Bacon) em cena de "O Homem sem Sombra", filme do holandês Paul Verhoeven, que já arrecadou quase US$ 80 milhões nos EUA



Para o diretor holandês, o ser humano mostraria o pior de si se pudesse passar despercebido


MILLY LACOMBE
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM LOS ANGELES

O que você faria se pudesse ficar invisível? Para o diretor Paul Verhoeven a resposta é simples: roubaria, mataria, estupraria. Uma resposta que condiz com a inquietação existencial desse holandês, conhecido em Hollywood por criar obras obscuras.
"Platão já escrevera que o homem, se pudesse ficar invisível e se livrar da opressão da sociedade, mostraria o pior de si", disse. "A verdade é que o homem só se comporta por causa das exigências sociais, da polícia, da punição", completou. "Caso contrário, seríamos todos criminosos."
E foi com isso em mente que Verhoeven levou às telas seu homem invisível. Quem espera assistir a um filme leve e sem grandes pretensões, como a comédia romântica que Chevy Chase e Daryl Hannah protagonizaram sob o tema ("Memórias de um Homem Invisível"), engana-se.
Kevin Bacon é Sebastian Caine, o cientista contratado pelo Pentágono para conduzir um estudo que busca a fórmula da invisibilidade. Experimentando a incrível e secretíssima descoberta nele mesmo, o cientista, seduzido pela liberdade que a transparência proporciona, acaba por transformar-se em um monstro. "Ele não é um homem perverso", defende Paul. "Ele se transforma em demônio no decorrer da trama."
"O Homem sem Sombra", ficção científica repleta de efeitos especiais de última geração e que já arrecadou quase US$ 80 milhões nos EUA, é, antes de mais nada, um thriller de terror e suspense.
Paul Verhoeven, 62, ficou conhecido em Hollywood quando dirigiu "Robocop", em 1987. Depois, emplacou sucessos como "Total Recall" (90) e "Instinto Selvagem" (92). Mas foi com "Showgirls" (95), a história de uma stripper em Las Vegas que tenta fazer carreira a qualquer custo, que ele mostrou seu lado mais sombrio. "Acho que não conseguiria fazer nada mais perverso do que isso", disse ele sobre "Showgirls".
Para melhor entender a complexidade interior desse sujeito, deve-se saber o seguinte: Paul Verhoeven é formado em física, tem doutorado em matemática, integrou o Exército holandês, fez carreira em Hollywood e há 15 anos estuda profundamente a vida de Jesus Cristo. "Entendo o personagem de Bacon porque, se eu ficasse invisível, talvez tivesse algumas de suas atitudes", disse.
"O que me separa da criminalidade é o cinema. Minhas obras são reflexos do que sou. Uso meus filmes para extravasar essa minha inquietação e, com o passar dos anos, tenho conseguido me transformar em um sujeito mais normal", disse, rindo da dificuldade em encontrar o adjetivo adequado para se autodescrever.
"Os filmes apenas refletem a sociedade. Não se pode dizer que filmes inspirem violência, isso é uma bobagem. Eles são apenas reflexos dela. O mesmo vale para o sexo. Filmes refletem desejos e realidades inerentes ao homem."
Há 15 anos ele participa de reuniões semanais para estudar a vida de Cristo. O grupo analisa a vida de Jesus e a intenção de Verhoeven é, claro, transformar a história em filme. "Tudo o que posso dizer é que vai ser polêmico."


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