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"O BEIJO DA SERPENTE"
Razão doma o instinto
CECÍLIA SAYAD
especial para a Folha
O cinema é uma das artes mais
sensíveis aos contrastes verdade/
mentira e real/simulação, por sua
própria natureza: o filme, afinal, é
a fotografia animada (que pode
modificar seu modelo por meio
de lentes, por exemplo) de uma
realidade que, no caso da ficção, é
encenada. "O Beijo da Serpente",
que estréia hoje, aborda uma das
questões que movem não só o cinema, mas toda manifestação artística -a tentativa de organizar
o mundo externo para apaziguar
os conflitos internos. A partir disso, vai passear, superficialmente,
pela questão acima citada.
À trama: aristocrática família da
Inglaterra do século 17 contrata o
reputado Meneer Chrome (Ewan
McGregor) para projetar um
imenso jardim. O projeto propõe
o confinamento de espécies selvagens a uma estufa, a título de exotismo para atrair curiosos.
Mas seus ideais chocam-se com
aqueles de Thea (Carmen Chaplin), a dita filha dita desequilibrada do homem que contrata
Chrome. Amante da natureza,
que reflete seu espírito indomável, ela sofre com a transformação
de sua floresta em atração turística. Uma vez que há séculos a natureza reflete sentimentos de personagens, aqui, a necessidade de
Chrome de domar seus impulsos
pela razão, simbolizada pela simetria do jardim, é atraída pela
aceitação dos perigos e da instabilidade dos sentimentos representada pelo amor que a jovem dedica à natureza. O ambiente do castelo em que Chrome trabalha, por
sua vez, mostra que a menina é
tratada como louca por ser a única a enxergar o que se passa à sua
volta: a infidelidade da mãe e a má
fé de seu primo. Entretanto, apesar da trama rocambolesca, o
principal conflito do filme é novamente o embate entre real e aparente, autenticidade e hipocrisia.
Tema abordado à exaustão, fica
diminuído pela opção de situar
não só a trama no passado, mas
também a abordagem, pois a superficialidade do tratamento que
tem no filme não faz jus às obras
que o antecedem e tratam do
mesmo assunto. Como Chrome
faz com suas plantas exóticas, o
diretor aprisiona o tema ameaçador em uma estufa chamada palatabilidade, criando apenas mais
um filme com amor, aventura e
boa reconstituição de época.
Avaliação:
Filme: O Beijo da Serpente
Título original: The Serpent's Kiss
Produção: Ale/Fra/ Reino Unido, 1997
Diretor: Philippe Rousselot
Com: Ewan McGregor, Greta Scacchi
Quando: a partir de hoje, no Lumière 2,
Market Place 3, Paulista 4 e SP Market 6
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