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Bosco faz caldo antropofágico
especial para a Folha
Talvez influenciado por imagens mais padronizadas do balé, João Bosco enveredou por
harmonias clássicas logo que
começou a criar a música de
"Benguelê".
"Essa primeira investida bateu na trave. Para meu alívio,
eu estava equivocado", diz o
compositor, que logo deixou
brotar as características mais
autênticas de sua música, ao
perceber que era exatamente
isso o que queriam os irmãos
Pederneiras (Paulo e Rodrigo).
"Esse lado mais negro de nossa música é muito ligado ao
corpo, que se manifesta naturalmente ao som de ritmos africanos, como se fosse uma extensão da música", diz Bosco.
Já sintonizado com as propostas do grupo Corpo, Bosco
não teve dificuldades em resgatar, na trilha de "Benguelê", o
ritmo afro que havia explorado
mais intensamente em discos
como "Gagabirô" e "Cabeça de
Nego", além das melodias tribais, o minimalismo e as influências de sua convivência
com Clementina de Jesus.
Satisfeito com o resultado, ele
afirma que chegou a uma convergência capaz de expressar a
amplidão da música brasileira,
ao misturar a negritude que se
encontra na Bahia, no Rio e
também em Minas Gerais.
Mas ao longo de "Benguelê" o
caráter primitivo da música negra brasileira vai se soltando,
para criar conexões com um
universo musical que também
ecoa no jazz, na cultura árabe,
da qual Bosco é descendente, e
mesmo em clássicos como
Stravisnky e Debussy.
"É como se essas serpentes
musicais, presentes em minha
memória, formassem uma caravana polifônica", diz Bosco,
que fez de "Benguelê" um caldo
antropofágico, em que pitadas
de Stravisnky se diluem com
delicadeza impressionista.
Essas múltiplas experiências
musicais que Bosco estende à
trilha de "Benguelê" se evidenciam principalmente no trecho
denominado "Travessia",
quando os bailarinos empreendem uma caminhada longa e
aparentemente interminável.
"Acho que a ousadia de fundir diferentes idéias musicais
faz parte da maturidade", observa Bosco, que fez pequenos
cortes na trilha original ao
adaptá-la à coreografia.
O CD editado para o espetáculo já estará à venda a partir
da estréia em São Paulo de
"Benguelê", cuja turnê nacional prossegue no Rio de Janeiro, em Brasília, Porto Alegre,
Curitiba e Belo Horizonte.
Já a versão musical completa
de "Benguelê" será lançada em
novembro, pela Sony Music.
Antigo admirador do Corpo,
o compositor reage como um
espectador animado. "Será
uma beleza assistir no mesmo
programa "Parabelo', a coreografia do ano passado que remete ao sertão, e "Benguelê',
que exala negritude."
(AFP)
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