São Paulo, terça, 29 de dezembro de 1998

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DISCO LANÇAMENTOS
Primeira guerra de Ice Cube sai nos EUA

PAULO VIEIRA
especial para a Folha

Não há perdão no gueto. Ice Cube, um dos poucos que podem ser chamados de OG ("original gangsta"), metido com o pessoal de Compton (Costa Oeste) até os ossos e por isso fundador do gangsta junto com uns poucos como Eazy-E, Mc Ren e Dr. Dre, acaba de voltar ao mercado depois de um sumiço de quase cinco anos.
Lançou nos EUA "War & Peace", o primeiro ("War") de uma série de dois discos, um bem produzido e agressivo CD. O segundo deve sair no começo de 99. Mas, por mais que se esforçasse, Cube jamais conseguiria voltar a ser "o preto que nós amamos odiar", um verdadeiro NWA (Nigga com Atitude, o grupo seminal que fundou com os caras do parágrafo anterior).
Os fãs de sua virulência verbal não suportam vê-lo contracenando, por exemplo, com Jennifer Lopez em "Anaconda", nem gostam de sabê-lo casado e pai de família.
A virulência verbal supracitada não é brincadeira. Cube já escreveu letras francamente homofóbicas, anti-semitas, contra "negros burgueses" e estimulou a beligerância dos cidadãos contra os comerciantes coreanos de Los Angeles. Assim, ao voltar a prensar sua revolta em disco, críticos, como o da comedida revista "Vibe", manifestaram-se contra "o rapper que agora fala ao telefone de sua van com ar-condicionado".
Cube paga por seu pioneirismo. Além de OG, estrelou um dos primeiros filmes a mostrar o gueto, "Boyz 'N the Hood". Este ano, entrou no disco dos brancos metaleiros do Korn (devolvem agora a cortesia na consistente faixa "Fuck Dying") e, em "War", utiliza à farta bases de "Don't Speak", do No Doubt.
Se os fãs já não esperavam muita "atitude", talvez pedissem um pouco mais de profundidade nas rimas de Cube. Tiveram em troca profissionalismo e humor involuntário. Há comentários sociais ralos do tipo "a pena é injusta" ("Penitentiary") e machismo de butique ("If I Was Fucking You"). Finalmente, em "Extradition", Cube manda: "queria ser rico como Trump".
Há vocais sussurrados, gritos, atmosferas claustrofóbicas que lembram os tempos remotos de Comptom, explosões de carros e Cube se comparando a cada minuto ele próprio a uma explosão, um "clarão assustador". Seus parceiros no disco, Mack 10 e principalmente Mr. Short Khop, não contribuem com grandes "flows".
Talvez pelo fato de demorar tanto a lançar um disco, os críticos acabaram vendo virtudes de menos e desceram a lenha. É provável que gostassem, citando o próprio artista na faixa de trabalho, "Pushing Weight", de mandar a cabeça de Cube para um taxidermista.
Ignoraram que o cara já atuou, escreveu, dirigiu e encheu as burras com o cinema -e isso parece ser o que lhe concerne por ora. (Seus projetos de 98: "The Players Club", um "Showgirls" negro, escrito e dirigido por ele; "The 3 Kings", em que ele e George Clooney são soldados americanos procurando ouro no Iraque após a Guerra do Golfo.)
Talvez seja hora de falar do artista com a apresentação tradicional invertida: Ice Cube a.k.a . O'Shea Jackson.
²

Disco: War & Peace Vol 1 (The War Disc)
Artista: Ice Cube
Lançamento: Prority (importado)
Onde encomendar: Florida Discos (rua 24 de Maio, 116, térreo, tel. 011/223- 8359), Truk's (rua 24 de Maio, 116, 1º andar, tel. 011/222-6933) e Ática Shopping (av. Pedroso de Morais, 858, Pinheiros, tel. 011/ 867-0022)



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