São Paulo, domingo, 30 de janeiro de 2005

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LANÇAMENTO/DVD

Caixa de D.W. Griffith constrói a gramática elementar do cinema

TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA

Na história do cinema, como diria Glauber Rocha, "O Nascimento de uma Nação" (1913) é o Antigo Testamento, e "Intolerância" (1915), o Novo. Daí já se mede a importância de D.W. Griffith, o autor dos testamentos e de outras obras-primas incluídas no pacote da Continental.
Foi Griffith quem criou o bê-á-bá da gramática cinematográfica clássica: a montagem paralela e seu suspense, o close e suas afecções, a alternância entre planos fechados e abertos. Foi ele o pai fundador de Hollywood: por sua megalomania e fúria historicista, mas também por ter adaptado ao cinema a tradição teatral de representação burguesa, o melodrama oitocentista. Um século depois, o cinema americano ainda gira em torno dos testamentos griffithianos -"Titanic", de James Cameron, é uma bela prova.
O Novo Testamento de Griffith, libelo épico contra a intolerância social e religiosa, foi uma retratação em relação ao Antigo, o clássico mais reacionário e racista do cinema. O fato de Griffith ser filho de um sulista arruinado pela Guerra Civil Americana (1861-5) não justifica, mas explica um pouco "O Nascimento de uma Nação", em que a Ku Klux Klan faz o papel da cavalaria a salvar a mocinha das "hordas de negros".
Constitui um dos grandes paradoxos da história do cinema que Griffith, o reacionário, tenha inspirado Sergei Eisenstein, o russo vanguardista e revolucionário. Eisenstein -que defendia que Griffith fora influenciado pelas estruturas narrativas dos romances de Dickens- fez uma releitura dialética do paralelismo griffithiano, acentuando-lhes as oposições.
Ele achava que Griffith só tinha compreendido a oposição de forma acidental, não como verdadeira força motriz do organismo social. É assim que o russo acaba por potencializar o antagonismo e o choque do esquema "opulência da aristocracia + fome do povo = revolução", esboçado por Griffith no filme sobre a Revolução Francesa, "Órfãs da Tempestade" (1921), obra-prima do pacote.
Mas, como tratamos aqui da tradição hollywoodiana em seu nascedouro, a visão (esquemática) da grande história serve antes de pano de fundo para um (melo)drama individual: o das irmãs que se reencontram em "Órfãs", o do casal que se une em "América". Griffith não tira o seu pé do melodrama nem quando lida com um registro e ritmo tão diferentes como os da comédia, em "Guerra dos Sexos" (1928).


Coleção D.W. Griffith
    
Distribuidora: Continental; R$ 250


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