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Intensivo de interpretação prepara ator em 24 horas
ISABELLE MOREIRA LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL
Quanto tempo leva um aspirante a ator para se tornar ator de fato? A Folha testou um dos métodos mais rápidos ofertados em
São Paulo: um intensivão de seis
dias, sendo "24 horas de trabalho
focado na arte da interpretação"
com o diretor e preparador de
atores Beto Silveira, 54.
Durante quatro horas a reportagem da Folha esteve com 17 pessoas que se entregaram (quase)
por completo ao mundo da interpretação. No elenco, uma garota
de 12 anos com cara e jeito de modelo, uma atriz profissional, uma
empresária na faixa dos 40 e outras pessoas que estavam ali para
aprender técnicas de teatro, para
se "conhecer melhor" e, principalmente, para "investir" em si.
Ninguém sabia, antes do fim da
sessão, que estava sendo observado por uma repórter.
O método de Silveira é baseado
na imaginação profunda. O professor acredita que ao estimulá-la,
"o aluno desenvolve o auto-conhecimento, pode tirar as máscaras sociais que veste todos os dias
e conhecer seu verdadeiro "eu" para interpretar outras personalidades que traz dentro de si".
O curso começa com a apresentação de alguns alunos ansiosos,
seguida por um discurso sobre
sonhos. Silveira, o professor, começou a falar sobre como cada
pessoa é diferente quando está em
seu quarto e como tem medo de
se expor fora dele. Os alunos, então, tiveram de criar e interpretar
uma cena que abordasse o assunto. Saíram desde sessões de terapia até discussões de família.
O próximo exercício era mais
constrangedor para os não-atores. Tinham de "fingir" que procuravam um anel mágico embaixo de um móvel e que corriam o
risco de serem atacados por aranhas ferozes.
Depois da aranha e de um pouco de alongamento, os alunos
aprenderam sobre os "planos do
corpo" -baixo, médio, alto e superalto. Foram instruídos a fazer
movimentos ora encolhidos, ora
esticados, e a fazer caretas.
O próximo exercício foi "encaixar" e aconteceu em duplas. Enquanto uma pessoa parava em
uma posição qualquer, o par tinha de preencher os espaços vazios com seu corpo.
Esses exercícios serviram de
preparação para voltar à cena da
aranha que, desta vez, foi interpretada com mais "intensidade".
Imersão
"Imagine uma floresta. Você está entrando nesta floresta. Anda
por ela até chegar a uma linda clareira. É pôr-do-sol, e o céu tem cor
de "cenoura alegre" e violeta. Você
está emocionado com a beleza do
local e com o momento que vive.
Até que encontra uma túnica medieval. Você a veste e nota que, em
seus bolsos, há quatro gravetos,
que devem ser queimados, e quatro sementes, que devem ser plantadas. Cada graveto representa algo de ruim e cada semente algo
que falta em sua vida."
Essas eram as instruções de Silveira para o último exercício do
dia, considerado pela maioria dos
alunos o mais emocionante. Assim como nos outros, a base era a
imaginação. A diferença era que
os alunos teriam de depositar experiências pessoais em cada elemento da história.
Seguindo o roteiro, de olhos fechados e "sentindo" cada momento da atividade, os alunos começaram a interpretar, e cerca de
30 minutos mais tarde a concluíram, muitos às lágrimas. Flaviana
de Pádua, 22, a única atriz profissional no curso, foi uma das que
se emocionaram. "Eu não senti
dificuldade em queimar os gravetos, mas em plantar coisas que
preciso e que demoro a aceitar. Eu
não fiquei triste, mas aliviada. Foi
uma sensação boa", contou.
Já a restaurateur Simone Rossini, 43, que fez o curso como uma
espécie de "terapia", gostou das
atividades, mas não entrou no clima. "Os atores são mais sensíveis,
vão fundo no sentimento, e, para
mim, aquilo não é bem assim. Eu
respeito, mas não tive vontade de
derramar uma lágrima sequer. Eu
não levei a sério a ponto de sentir", afirma Rossini, que confessou ter ficado constrangida em alguns momentos.
No final do primeiro dia, o saldo
foi positivo. Pelo menos a metade
do grupo garantiu que gostou do
método baseado em imaginação.
A estudante do curso de artes do
corpo da PUC-SP, Natália Fagnani, 19, acredita que com o uso da
memória afetiva passa a ter controle sobre suas emoções. "Fica
mais fácil entrar e sair do personagem. A gente tem que treinar a
imaginação para segurar a onda
quando estamos em cena", disse.
O próprio professor, no entanto, adverte: 24 horas não são o suficiente para se tornar um ator
completo. "Serve mais como auto-conhecimento para depois a
pessoa se aprofundar no teatro fazendo cursos, estudando sempre.
Nunca um ator está formado totalmente", disse Silveira, que, em
quase 35 anos de carreira, já preparou atores como Ana Paula
Arósio, Fábio Assunção, Débora
Evelyn e Débora Secco, sempre
utilizando o método de imaginação, de auto-conhecimento e de
desenvolvimento humano.
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