São Paulo, sexta-feira, 30 de março de 2001

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MÚSICA/LANÇAMENTO

Robopop

Dupla francesa Daft Punk lança "Discovery", quatro anos depois do aclamado "Homework"; o CD inclui cartão com um número de acesso a faixas disponíveis só na Internet

LEANDRO FORTINO
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA

Após uma impecável "lição de casa" (em inglês "Homework", álbum de 1996), a sensação da música eletrônica francesa, o duo Daft Punk, volta à ativa com "Discovery" (Descoberta). Ou seria "very disco" (muito disco music)? Talvez sejam as duas coisas.
A dupla Guy-Manuel de Homem-Christo e Thomas Bangalter faz agora o grande exame pelo qual todo artista passa quando lança o segundo disco após um aclamado álbum de estréia: superar as expectativas e provar que o novo trabalho mantém, no mínimo, o mesmo padrão do anterior.
O primeiro exame dessa prova foi bem-sucedido. O single "One More Time", lançado no final do ano passado, estourou no mundo todo e armou a cama para o lançamento de "Discovery".
É um trabalho diferente de "Homework". A simplicidade e crueza continuam, as batidas e pequenos samples de vocais se mantêm repetitivos ao extremo e a criatividade permanece intocável.
Mas, desta vez, entram em ação letras e vocais, ora falados por uma voz robotizada, ora cantados por vocalistas de house music.
E não é só isso. "Discovery" inclui um cartão, o Daft Club, com um número, com o qual o proprietário do CD descarrega, via Internet, o Daft Player (programa para pegar e executar músicas no computador), que tornará possível, a cada semana pelos próximos três anos, "puxar" uma música nova do Daft Punk.
O sistema é na verdade uma resposta ao Napster, que, durante o hype em torno do lançamento de "Discovery", fez pipocar músicas falsas da dupla. Sobre isso e sobre passar a usar máscaras e luvas de robô em todo o trabalho promocional de "Discovery", Guy-Manuel de Homem-Christo, uma das metades da dupla que influenciou abertamente a popstar Madonna em seu último álbum, deu à Folha a seguinte entrevista.

Folha - Você acha que o Daft Punk deu identidade à música francesa?
Guy-Manuel de Homem-Christo -
Não. Somos da França e é verdade que nada de bom estava sendo feito por lá nos últimos anos. A França não é muito conhecida por seus músicos. Só alguns, como (Serge) Gainsbourg. Não acho que a nossa música é típica da França. Não dá para comparar com a música feita na Inglaterra ou nos EUA. Mas estamos falando de música eletrônica, de house music, que é internacional e pode ser feita em qualquer lugar.

Folha - Então você acha que o chamado "french touch" é mais um rótulo inventado pela imprensa?
Homem-Christo -
Exatamente. Não sei se é bom ou ruim, mas foi criado pela imprensa, e não pelos franceses. Rótulos dividem a música em categorias e limitam demais o trabalho do músico. A nossa música não tem limites. Tem mais a ver com liberdade.

Folha - Por que vocês decidiram usar luvas e máscaras de robôs?
Homem-Christo -
Nosso principal interesse é criar coisas novas. Criar música, que é a razão de nosso trabalho, e coisas que rodeiam a música, como vídeos. Usar máscaras é parte do processo de criação. É mais interessante para nós fazer isso do que sermos popstars, fazendo poses para fotos. Não estamos nessa de virarmos ídolos. Gostamos da idéia de estar no mesmo nível das pessoas que gostam das nossas músicas.

Folha - Vocês planejam levar "Discovery" para o palco?
Homem-Christo -
Ainda não temos planos para uma turnê. Criamos o Daft Club e este ano trabalharemos apenas nesse projeto. Vamos disponibilizar novas músicas toda semana.

Folha - Mas, por enquanto, há apenas uma faixa disponível.
Homem-Christo -
É porque estamos no começo, que é muito difícil. Mas, nesta semana, haverá mais uma faixa e, depois, colocaremos uma música nova por semana ou remixes. Será o nosso trabalho neste ano: colocar à disposição músicas novas para quem tem acesso ao Daft Club.

Folha - É verdade que algumas faixas do Daft Punk que estão no Napster não são suas?
Homem-Christo -
Sim.

Folha - E o que você acha da polêmica criada em torno do Napster?
Homem-Christo -
O bom do Napster é que levantou questões. Alguns tinham medo, outros ficaram muito felizes. Nossa resposta ao Napster é o Daft Club. É uma idéia nova e um jeito de driblar o Napster sem atacá-lo. Nós também usávamos o Napster, não vejo problema. Se alguém resolver colocar "Discovery" no Napster, não há problema nenhum. Apenas sugerimos que é melhor comprar o disco, ficar membro do Daft Club e pegar as nossas músicas novas toda semana.

Folha - Madonna afirmou gostar muito do Daft Punk e, em seu último disco, algumas faixas parecem bastante com as músicas de vocês.
Homem-Christo -
É um grande estímulo. Amamos a Madonna, ela tem o talento de sempre fazer coisas novas. Acho que temos isso em comum. É estimulante ouvir isso, mas não damos importância. Só nos deixa lisonjeados.


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