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Líder "não teve tempo para ter medo"
especial para a Folha
A leitura de "Carlos Marighella -
O Inimigo Número Um da Ditadura Militar", de Emiliano José,
me lembrou outro livro, também
publicado recentemente no Brasil:
"Napoleão", de Stendhal.
Espere. Não se compara a figura
de Marighella com a de Napoleão,
dois revolucionários de dimensões
opostas. Mas ambos os livros são
biografias de autores envolvidos
(movidos?) pela paixão, que levam
a uma pergunta sem resposta:
Qual o papel de uma biografia?
Stendhal, já famoso, afirmava,
no prefácio, que seu personagem
foi "o maior homem que surgiu
depois de César". Relata os poucos
encontros que ambos tiveram
-Stendhal lutou nas guerras napoleônicas.
Declara que escreve a biografia
para resgatar a verdade e canonizar, sim, seu ídolo. "O amor por
Napoleão é a única paixão que me
restou", escreveu o autor de "Vermelho e Negro".
Emiliano José, jornalista, foi militante de esquerda. Foi liderança
do movimento estudantil, em 68.
Foi preso e coisa e tal e afirma, no
prefácio de seu livro, que não pretende biografar Marighella, mas
fazer uma reportagem.
No entanto, Emiliano quase não
ouviu a versão dos militares. Não
conseguiu, apesar das tentativas.
Existe uma conduta desonesta e irresponsável dos antigos atores do
regime militar brasileiro, que se
calam quando o assunto é repressão aos opositores.
Para bom entendedor, poucas
novidades saltam aos olhos, ao ler
"Carlos Marighella - O Inimigo
Número Um da Ditadura Militar".
Não se revelam detalhes dos meses
que Marighella passou em Cuba, o
que mudou sua vida.
Uma pena que o autor não registre o que aconteceu com a ALN,
após a morte de seu líder.
Por ser um dos livros mais esperados sobre o maior personagem
da resistência armado ao regime
de 64, a biografia-reportagem pode parecer incompleta.
Mas o autor cumpre com talento
o seu dever de "resgatar" a história
de um homem que pensou, refletiu e atuou pelo seu país, independentemente dos erros e acertos.
Narra em detalhes a operação
que resultou na sua morte. Conta a
infância do estudante e poeta Marighella. Traz de volta a história do
PCB, seus debates internos e sua
participação na Constituinte de
46. Revela uma faceta bem humorada do dirigente durão.
"Jorge Amado, seu parceiro de
redação de discursos da bancada
comunista em 1946, diz que Marighella havia nascido para rir", escreve. Para Emiliano José, Marighella foi mais que uma liderança
contra regime militar.
Para ele, foi um personagem de
todo o século que, como se lê em
sua lápide, desenhada pelo arquiteto Oscar Niemeyer, "não teve
tempo para ter medo".
(MRP)
Livro: Carlos Marighella - O Inimigo
Número Um da Ditadura
Editora: Sol & Chuva (tel. 011/816-1684)
Preço: R$ 28 (264 págs.)
Lançamento: segunda, 19h
Onde: Ática Shopping Cultural (av.
Pedroso de Morais, 858, São Paulo, tel.
011/867-0022)
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