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CINEMA
Bengell prepara filme sobre sua vida
OTÁVIO DIAS
da Reportagem Local
Norma Bengell, 62, foi a atriz
brasileira de cinema mais cult dos
anos 60. No final dos 80, passou
para o outro lado da câmera e se
tornou diretora. Em 99, ela fechará um ciclo em sua trajetória cinematográfica ao voltar às telas não
como intérprete, mas como personagem de um filme.
O personagem principal do novo
projeto cinematográfico de Bengell é ela mesma. Será a história de
uma atriz que participou de alguns
dos mais importantes momentos
do cinema brasileiro, se tornou estrela na Itália e na França, e, como
mulher, criou polêmica e desafiou
costumes nos anos 60 e 70.
"Acho que vivi muitas coisas.
Como muitos de nós, sou uma sobrevivente. O sucesso é uma bobagem, mas da minha vida não posso abrir mão. E acho que ela pode
trazer informações para outras gerações", afirmou Bengell, em entrevista à Folha.
Bengell não quer, entretanto,
que sua projeção na tela seja muito
fiel a ela própria na vida real. Por
isso, convidou para estrelar o filme uma atriz em ascensão que não
a lembra em nada: Mira Sorvino.
Sorvino foi revelada no filme
"Poderosa Afrodite" ("Mighty
Aphrodite", 1995), de Woody Allen, com o qual ganhou o Oscar de
melhor atriz coadjuvante, e, desde
então, vem consolidando uma
carreira de sucesso.
Para a diretora, Sorvino adicionaria ao papel uma nova imagem e
uma nova atitude, transformando-o mais em um personagem e
menos em uma tentativa de imitação da Norma de carne e osso.
As negociações estão em andamento e dependem, basicamente,
de Sorvino aceitar um cachê próximo dos padrões brasileiros.
Se representar Norma na tela já é
arriscado, muito mais perigoso seria incluir no filme astros do cinema com quem a atriz conviveu ou
trabalhou, como, por exemplo, o
ator francês Alain Delon. Para evitar um desfile fútil de celebridades, todos os nomes serão fictícios
e apenas as pessoas realmente importantes para sua formação e sua
vida estarão presentes.
Da revista ao cinema italiano
Norma Bengell, filha única, nasceu no Rio de Janeiro em 1935. Sua
mãe vinha de uma família de classe média alta e o pai, afinador de
piano e quase duas vezes mais velho, era um imigrante alemão.
O casamento, marcado por conflitos, acabou quando Norma tinha dez anos.
Sua carreira começou ainda durante a adolescência, nos anos 50,
como modelo da Casa Canadá,
uma confecção de alta costura na
moda na época. Logo depois, pisou nos palcos pela primeira vez
como vedete dos shows de Carlos
Machado, apresentados na casa
noturna carioca Night & Day.
Norma Bengell estreou no cinema em "O Homem do Sputiniki",
em 59, no qual contracenou com
Oscarito. Dois anos depois, ganhou seu primeiro papel principal, em "Mulheres e Milhões" (61).
Mas foi em 62 que sua carreira se
firmou definitivamente, com a
participação em "O Pagador de
Promessas", de Anselmo Duarte.
O filme ganhou o Palma de Ouro
no Festival Internacional de Cannes e Norma, um contrato com o
produtor Dino de Laurentis para
trabalhar no cinema italiano.
Na Itália, ela filmou, entre outros, "O Mafioso", de Alberto Latuada, com Alberto Sordi.
Ainda em 62, se tornou um símbolo sexual ao aparecer nua numa
praia, durante uma sequência de
mais de cinco minutos, no filme
"Os Cafajestes", de Ruy Guerra.
Oposição ao regime militar
Uma nova guinada em sua trajetória ocorreu no final dos anos 60,
já de volta ao Brasil, quando, meio
sem querer, se viu envolvida na
oposição ao regime militar.
A atriz participava de uma manifestação em protesto contra a
morte do estudante Édson Luís,
baleado num confronto de opositores do regime com a polícia.
"Um estudante me reconheceu e
pediu para eu dizer alguma coisa.
Quando cheguei ao parapeito da
Assembléia Legislativa e vi aquele
mar de gente, comecei a chorar. A
única coisa que me veio à cabeça
foi uma coisa muito feminina.
Disse: "Eu me recuso a ter filhos
para serem assassinados pela ditadura'. A reação do público foi
imensa e, no dia seguinte, a frase
estava nas primeiras páginas dos
jornais. Assim começou meu envolvimento político", conta.
Durante boa parte da década de
70, Norma viveu em Paris, num
exílio mais ou menos voluntário,
devido à perseguição política no
Brasil. Foram anos dedicados
também ao teatro
"Nos anos 60 e 70, ocorreram
mudanças radicais no mundo inteiro. O que me salvou, como atriz
e como mulher, foi essa tomada de
consciência", diz.
É essa mistura de experiências
artísticas, culturais, políticas e de
comportamento que ela pretende
mostrar no novo filme, que começará a ser rodado no segundo semestre e deverá estar pronto em
março de 99.
"Norma" será "quase um musical". A trilha sonora inédita, com
um toque de bossa nova, será encomendada a um compositor jovem ainda não escolhido. "Meu
objetivo é fazer um filme extrovertido e alegre, que tenha algo de libertário e que traga esperança."
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