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Suassuna conclui e amplia "A Pedra"
Autor retomou saga dos Quaderna depois de adaptações de Luiz Fernando Carvalho à TV e Antunes Filho ao teatro
Escritor termina versão do novo romance até o final
do ano; minissérie estréia em junho com conclusões para histórias em aberto
DO ENVIADO A RECIFE
Ariano Suassuna espera entregar até o fim do ano à editora
José Olympio a versão final de
seu "livro 1", a "preqüência" de
"A Pedra do Reino". Narrado
como autobiografia do personagem Dom Pedro Dinis Ferreira-Quaderna, o livro conta a
saga de uma família que se auto-proclama verdadeira descendente dos reis brasileiros,
que nada têm a ver com "imperadores estrangeirados e falsificados da Casa de Bragança".
A narrativa é inspirada ao
mesmo tempo em romances de
cavalaria, literatura de cordel e
outros elementos da cultura
popular brasileira, que Suassuna defende, desde o início da
década de 1970, em seu Movimento Armorial.
Reeditado no fim de 2004, no
ano passado o alentado livro de
mais de 700 páginas foi adaptado para o teatro por Antunes
Filho e em junho chega à TV
pelas mãos do diretor Luiz Fernando Carvalho, que em 1994
já havia transformado em especial "A Mulher Vestida de Sol",
a primeira peça de Suassuna,
escrita há 60 anos.
"A Pedra do Reino", a minissérie, terá cinco capítulos e está
programada para terminar no
dia 16 de junho, quando Suassuna festeja seus 80 anos.
Retomada
Antes da adaptação, assinada
por Bráulio Tavares e Luís Alberto de Abreu, Suassuna propôs ao diretor finalizar "algumas coisas que ficaram inconclusas" nos originais de "A Pedra do Reino". Como o crime
em que o personagem Dom Pedro Sebastião, tio e padrinho de
Quaderna, aparece morto em
um quarto fechado e não se sabe como ele morreu. E ainda a
história de amor entre os personagens Sinésio e Heliana.
"Com essa retomada, eu me
empolguei. Resolvi reintroduzir "A Pedra do Reino" no meu
plano original, de cinco livros,
que podem ser lidos independentemente. Fico até com vergonha, um homem de 80 anos
fazendo uma previsão dessas",
brinca Suassuna, que escreve à
mão, todas as manhãs, e promete uma novidade.
"O meu teatro é bastante conhecido, principalmente "O
Auto da Compadecida", que não
é minha peça predileta, mas é
disparada a predileta do público. Fiquei conhecido como dramaturgo e, um pouco menos,
como romancista. Mas minha
poesia é completamente obscura. Agora estou fundindo pela primeira vez os três gêneros,
porque na minha opinião a minha poesia é a fonte profunda
de tudo o que eu escrevo, inclusive do teatro e do romance."
Taperoá
"A Pedra do Reino" foi toda
filmada em Taperoá, sertão da
Paraíba, cenário dos acontecimentos do romance e espécie
de berço do imaginário de
Suassuna, que viveu ali parte de
sua infância, depois de perder o
pai, o político João Suassuna,
assassinado durante a Revolução de 1930, no Rio de Janeiro.
Foi em Taperoá que Suassuna
iniciou a mescla do popular
-ali ele viu as primeiras peças
de mamulengos (teatro de bonecos) e desafios de viola- e
erudito, que marca sua obra.
"A infância e a adolescência
em geral são períodos muito
importantes, porque nessa
época se forma universo mítico
e interior de cada escritor. O
sertão da Paraíba foi uma experiência fundamental, principalmente porque tive infância
marcada por acontecimentos
fortes. Apesar de ter perdido
meu pai muito cedo, tive forte
influência dele, que era grande
leitor e nos deixou uma excelente biblioteca, o que não era
comum. Foi ali que li pela primeira vez "O Cortiço", "Os Sertões", "Os Maias" etc."
Em 1942, já adolescente,
Suassuna se mudou para Recife, onde viu crescer seu interesse pelas artes plásticas, ao freqüentar a biblioteca do Ginásio
Pernambucano e no encontro
com o pintor Francisco Brennand. A formação cultural foi
ampliada e se consolidou na faculdade de Direito, quando
Suassuna formou o grupo de
Teatro dos Estudantes de Pernambuco. Faltava, no entanto,
outra marca registrada da obra
de Suassuna: o humor.
Por conta dos acontecimentos da infância, diz ele, a descoberta da veia cômica foi tardia.
E ele atribui papel importante à
sua mulher, Zélia.
"Até certa idade era travado,
só escrevia tragédias. Depois
que conheci Zélia a impressão
que tenho é a de que alguma
coisa se desatou dentro de
mim. Ela me abriu os olhos para o riso e a alegria do mundo."
A guinada para o cômico se
deu, conta Suassuna, quando
ele, tal qual um poeta romântico do século 19, teve tuberculose aos 21 anos. E voltou a Taperoá, onde Zélia, com quem ainda não era casado, foi visitá-lo.
"Lá eu escrevi a primeira peça cômica da minha vida. Era
uma peça em um ato, para mamulengos, que se chamava
"Torturas de um Coração ou
Em Boca Fechada Não Entra
Mosquito". Fiz para recebê-la.
Olhe, você veja, eu tinha tudo
para não fazer porque estava
doente. Mas aí ela já tinha desatado o nó lá de dentro. E doença
de pulmão eu ia tirar de letra."
Animoso
Parafraseando seu narrador
em "A Pedra do Reino", Suassuna defende que o humor é sua
defesa contra o que a vida tem
de sombrio: "O riso a cavalo e o
galope do sonho são as duas armas de que disponho para enfrentar a dura, mas fascinante,
tarefa de viver", diz o escritor,
sem tempo para balanços de 80
anos. "Sou por natureza um sujeito animoso e bem-humorado. Mesmo com 80 anos. Então
continuo enfrentando a vida",
diz. "Não sou otimista nem pessimista. Acho os primeiros ingênuos e os segundos, amargos.
Eu procuro ser realista esperançoso. E é por isso que o livro
está demorando tanto. Resolvi
fazer o primeiro, de jeito que, se
não conseguir fazer os outros,
ele sozinho dá uma idéia do
conjunto. É esse meu projeto
por enquanto."
(ES)
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