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"Banquete tropicalista" de Glauber volta restaurado
Clássico "O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro" reestréia hoje
Premiado em Cannes-69, filme de Glauber Rocha teve negativos perdidos em incêndio e faz parte de pacote de relançamentos
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Este maio ganha ainda mais
sentido com o relançamento
oportuno de "O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro", filme que na cultura brasileira se impôs, ao lado do disco
"Tropicália ou Panis et Circensis", como a expressão nacional
dos ideais de uma época, 1968,
de que neste mês se comemoraram 40 anos.
A restauração do filme de
Glauber Rocha (prêmio de melhor direção em Cannes em
1969) promove a revisão no
"tropicolor" original da obra,
cuja sobrevivência esteve
ameaçada desde que seus negativos se perderam num incêndio em 1972 no laboratório
GCT, na França.
Em 1983, uma cópia dublada
em francês foi entregue à Cinemateca Brasileira por seu co-produtor Claude Antoine. A
partir de 2003, quando Paloma
Rocha assumiu a frente dos trabalhos de preservação dos filmes do pai, começou a ser feito
um processo de pesquisa e reconstituição de cinco longas de
Glauber.
Segundo Paloma, "a segunda
fase do projeto, cujo objetivo é
restaurar os filmes que Glauber
realizou no exílio, como "O
Leão de Sete Cabeças" e 'História do Brasil", está em fase de
captação de recursos".
O restauro contou com a supervisão de técnicos envolvidos
na produção original. Envolve
também aspectos rocambolescos, como o áudio de "O Dragão...", cuja versão em português foi feita a partir de uma cópia que se encontrava na Cinemateca de Cuba e teve um pequeno trecho resgatado de material pirata na internet.
A estética glauberiana, acusada recentemente pelo humorista Marcelo Madureira de ser
uma "merda", é de difícil assimilação. Há uma saturação de
sentidos em sua interpretação
dos mitos e da desigual estrutura social brasileira, intensificada pela forma modernizante,
de ruptura e antropofágica, que
Glauber impõe.
"O Dragão..." é um desdobramento da épica que o cineasta formulou em "Deus e o
Diabo na Terra do Sol". À dimensão popular (do povo como protagonista, da religiosidade como força de rebelião) e
à retomada do cangaceiro Antonio das Mortes, ele agrega a
dimensão da política no coronel, retrato do Brasil repressor
naquele momento e em outros
tempos.
Em "O Dragão...", Glauber
emula a epopéia do western,
devora os códigos gerados pela
matriz norte-americana e os
devolve sob a forma de alegoria,
excessiva e violenta, com cortes
abruptos, descontinuidades e
encenação sempre no limite.
Este banquete tropicalista,
iluminado pela vestimenta roxa de Odete Lara, pode até ser
visto como uma "merda", mas
não deixa de ter a nossa cara.
O DRAGÃO DA MALDADE CONTRA O SANTO GUERREIRO
Produção: Brasil, 1968
Direção: Glauber Rocha
Com: Mauricio do Valle, Othon Bastos
Onde: a partir de hoje no Espaço Unibanco Pompéia; classificação: 14 anos
Avaliação: ótimo
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