São Paulo, sexta-feira, 30 de junho de 2000


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CRÍTICA
Filme simula travessia bíblica

LEON CAKOFF
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A grande virtude da nova produção Disney não foge à sua própria regra: humaniza os dinossauros com sentimentos. O fascínio pelos dinossauros tem aí a sua primeira chave. Que mundo seria então aquele sem homens e mitologia? A magnífica abertura oferece um passeio panorâmico com milhares de dinossauros em campo aberto, misturando paisagens naturais com animação.
O "milagre" da recriação em 3D, que consumiu US$ 200 milhões e 3,2 milhões de horas em processamento de dados, enche a tela com a fauna do Cretáceo Superior. Qual dessas figuras refletiria a imagem de Deus?
O filme dos estreantes Ralph Zondag e Eric Leighton é uma bênção para os dinomaníacos que se deixam fascinar pelos dilemas da criação. O que somos, de onde viemos e para onde vamos será um pouquinho respondido por este filme pela simples provocação de dar sentimento a criaturas vistas como monstruosas e que ocuparam o "nosso" espaço na Terra há 65 milhões de anos.
Os "terríveis lagartos" da Disney, além dos dons da fala e da sociabilidade, agem com bom senso. Comportam-se exemplarmente para não decepcionar os dinomaníacos adultos. A vantagem é grande, em se tratando de produto Disney: ao menos eles não se metem a besta e cantam.
"Dinossauro" praticamente começa pelo apocalipse, o mergulho de meteoros na Terra para depois sugerir com seus "personagens" uma dolorosa travessia bíblica, cheia de provações, como as de Moisés. Otimista, o filme conduz os nossos dinossauros a um oásis.
Igualmente bíblica é a inspiração da travessia do ovo do iguanodonte até ser chocado com segurança em uma ilha paradisíaca, adotado como Tarzan por uma família de lêmures, e crescer com o espírito positivo de liderança. Já adolescente, ele será Aladar, o protagonista do filme.
A sequência da travessia do inocente ovo do dinossauro herbívoro por bocas de raptores justifica a criação e o emprego eletrizante do que a produção batizou como "dino-cam", uma câmera computadorizada que atingia a velocidade de 50 km, era suspensa por cabos a 50 metros do solo, rodava a 250 quadros por segundo (contra os 24 de uma filmagem normal) e girava 360 graus. É inevitável a sensação de cumplicidade.
Para os cinéfilos, há um jogo de anacronismos, já que o roteiro de "Dinossauro" foi escrito por Walon Green, 64, autora de um dos melhores roteiros de faroeste: de "Meu Ódio Será a Sua Herança" (1969), de Sam Peckinpah.
Nesse clássico de grandeza shakespeariana, um bando de obstinados se batia desatento à passagem do tempo. Com os dinossauros, o tempo é a natureza de todos os suplícios. Ninguém regride milhões de anos impunemente.


Avaliação:     


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