São Paulo, sábado, 30 de junho de 2007

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Espanha em perigo moveu as maquinações da princesa

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Grande parte da incompreensão com relação à figura de Carlota Joaquina no Brasil está relacionada ao fato de que os livros de história ainda explicam muito mal o contexto político que determinou sua vinda e suas atitudes na corte do Rio.
É fato que todos os membros da família real ganharam contornos folclóricos, por conta das historiografias tanto liberal como marxista, que viam no passado português as razões do atraso do Brasil. Exagerou-se na forma caricata de representá-los, para que, no imaginário coletivo, ficassem gravados como o oposto daquilo que se achava que o país deveria ser após eliminar os traços que ainda o ancoravam no Antigo Regime, tornando-se uma República moderna e "civilizada".
A imagem da princesa espanhola Carlota Joaquina foi a que mais sofreu nesse processo. Não apenas pela sua tão falada -e pouco provada- coleção de amantes, mas principalmente por mostrar-se, muitas vezes de forma descarada, a serviço de outra coroa.
Mas Carlota Joaquina não maquinava contra os interesses portugueses só por ter uma personalidade traiçoeira, como mostram as explicações clássicas. A princesa tinha lá suas razões para explicar a desenfreada atividade política a que se dedicou por meio de cartas e manipulações diplomáticas.
Pouco depois de desembarcar no Rio, Carlota soube que Napoleão usurpara a coroa do seu pai, o rei da Espanha, e feito sua família refém. As notícias do povo revoltando-se nas ruas de Madri a desesperavam a cada dia. Foi tomada pela determinação de reabilitar sua dinastia, a dos Bourbon, e de retomar o controle do reino.
A situação da coroa espanhola não era frágil apenas na Europa. A diluição da monarquia incitava desejos independentistas dos vice-reinados na América. E, além da possibilidade de emancipação das colônias, a Espanha ainda enfrentava a ameaça de Portugal que, com o apoio da Inglaterra, sonhava em construir um grande império português nos trópicos, incluindo a região do Prata.
A luta para manter as possessões espanholas e resgatar o poder de sua família moveu a frenética atividade política de Carlota Joaquina. À distância, vislumbrava a possibilidade de ser rainha, se não da Espanha libertada e reunida a Portugal, ao menos dos territórios americanos. Se o fez por ambição pessoal ou por simples nacionalismo, cabe ao futuro julgar.
Seus esforços, porém, foram atropelados pela aceleração da história nos estertores do Antigo Regime. A América Hispânica já se encontrava num processo sem volta de tornar-se independente, enquanto na Europa terminava um ciclo que não deixava brechas para a volta de sua cabeça coroada.
Agora, a revisão historiográfica que se anuncia promete desconstruir o estereótipo que temos de Carlota Joaquina. Nada mudará, entretanto, o final trágico de sua trajetória.


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