São Paulo, Quinta-feira, 30 de Setembro de 1999
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ENTREVISTA

"É uma descida ao inferno", diz Myrick

Divulgação
Eduardo Sanchez e Daniel Myrick, diretores de "A Bruxa de Blair"


ALEXANDRE MARON
da Reportagem Local

Apesar de ser um dos autores da idéia doentia de colocar três jovens sofrendo numa floresta por vários dias e de, com isso, ter dirigido um dos filmes mais assustadores dos últimos anos, Daniel Myrick, 35, um dos dois diretores de "A Bruxa de Blair", tenta convencer a todos de que é um cara convencional.
"Pensam que somos pessoas soturnas, mas eu e Ed (Eduardo Sanchez, 30, co-diretor do filme) somos só dois caras normais que fizeram um filme de terror", disse Myrick à Folha, por telefone, de seu escritório na Flórida.
Antes de ganhar as capas de revistas de cinema em todo o mundo, além de "Time" e "Newsweek", Myrick foi bartender e gravou vídeos institucionais para empresas, além de alguns curtas-metragens com amigos. "A experiência seminal de Ed com cinema foi "Guerra nas Estrelas", e a minha, "Contatos Imediatos do Terceiro Grau", o filme que me fez querer fazer filmes", conta.
Na entrevista a seguir, Myrick fala de seu filme, da forma que a tecnologia digital ajuda cineastas como ele e como quebrou regras de ouro de Hollywood e fez um filme que rendeu US$ 138,4 milhões.

Folha - De onde surgiu a idéia de "A Bruxa de Blair"?
Daniel Myrick -
Ed e eu estávamos conversando sobre como não havia mais filmes de terror que nos assustassem, como "O Iluminado" e "O Exorcista", ou documentários arrepiantes sobre OVNIs, narrados por Leonard Nimoy, o sr. Spock. Seria legal fazer um filme daqueles.

Folha - Como você define o filme?
Myrick -
"Blair" é um filme caseiro de três pessoas descendo ao inferno. E, se você for ao cinema só com a expectativa, terá uma experiência inesquecível. Mas não mudará a sua vida, é apenas um filme de terror. Deixe-o ser o que é.

Folha - O nome Blair vem de lendas reais ou do nome Linda Blair, a protagonista de "O Exorcista"?
Myrick -
Não tem nada a ver com "O Exorcista". A irmã de Ed estudou em uma escola em Maryland chamada Blair.

Folha - E como será a continuação?
Myrick -
Há a história de Elly Kedward, a bruxa de Blair original, de 1785, e Rustin Parr, o assassino em série que matou sete crianças em 1941. Ambas citadas no filme e no site.

Folha - E a continuação vai se parecer com o original?
Myrick -
Nossos próximos filmes serão mais tradicionais. Mas aplicaremos a essência do que fizemos em "Blair": o que nos faz chorar ou rir. Os fundamentos que acho que Hollywood perdeu de vista. Eles pensam que dezenas de milhões de dólares em efeitos fazem um bom filme. Isso não é necessariamente verdade e nosso filme é a prova.

Folha - George Lucas disse em uma entrevista que o próximo gênio cineasta sairia de uma garagem usando um equipamento digital barato, e vocês são algo parecido com essa tendência.
Myrick -
Não se pode parar o processo criativo. As pessoas encontram jeitos de fazer filmes, e a tecnologia digital coloca novas ferramentas nas mãos dos cineastas. Com a Internet, você não precisará da forma usual de distribuição. Os Martins Scorseses que nunca tiveram a chance de dirigir um filme poderão fazer isso agora. É muito excitante.

Folha - Vocês preferem permanecer no circuito independente ou nas produções cheias de efeitos especiais?
Myrick -
Nossa definição de filmes independentes é fazê-los nos nossos termos. George Lucas é independente, porque faz filmes nos seus termos, mas gasta milhões de dólares em efeitos especiais. Isso não significa que nunca faremos uma produção milionária. Há roteiros que adorei e que seriam muito caros, porque é assim que eles são. Mas, quando eu os fizer, não quero ter um executivo de estúdio me dando ordens. Temos que traçar nosso caminho até podermos fazer um filme desses sem interferência.

Folha - Uma pesquisa indicou que as pessoas que assistiram ao filme sem conhecimento prévio do conteúdo o odiaram, e que, quem leu artigos a respeito gostou mais. O que você acha disso?
Myrick -
Concordo. Acho que esse filme é de um tipo em que você precisa condicionar as pessoas. Não é algo que já tenham visto. Se você for esperando por "Pânico" ficará desapontado. É importante que as pessoas saibam o que o filme é. Se elas forem ao cinema com a mente aberta e alguma idéia do que verão, vão se divertir.

Folha - O que você mais gostou no filme e o que não funcionou?
Myrick -
Gosto da performance dos atores, nunca vi nada parecido. Não gosto das câmeras tremendo demais. Mas isso ajuda o filme, torna-o desconfortável. Não queria que se tornasse uma distração. Na edição tentamos diminuir isso um pouco.

Folha - Vocês sabem que no próximo projeto haverá comparações. Myrick - No próximo filme, uma comédia chamada "Heart of Love", tentamos evitar isso. É por esse motivo que pensamos em uma comédia, que será a mais estúpida e a mais politicamente incorreta possível. Se não for bem, voltaremos ao terror. Mas é impossível evitar comparações. "Blair" é um degrau e não uma catapulta para uma carreira brilhante. Todos os cineastas enfrentam isso em seu segundo projeto.

Folha - Como vocês se sentem sendo milionários, com um filme que arrecadou US$ 138 milhões?
Myrick -
Não sei ainda. Os cheques chegam à minha mesa, mas ainda não tive tempo de gastá-los (risos).



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