São Paulo, domingo, 30 de setembro de 2007

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Crítica/"Das Tripas Coração"

Ana Carolina expõe as contradições da sexualidade

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Em "Das Tripas Coração" (1982), de Ana Carolina, que chega agora em DVD, tudo acontece num colégio católico de moças prestes a ser vendido e demolido. Enquanto espera as diretoras da escola na sala de reuniões, o interventor designado para liquidar o negócio (Antonio Fagundes) cochila e tem sonhos malucos com as alunas, professoras e serventes.
Poderia ser apenas um pesadelo machista, à maneira de "A Cidade das Mulheres", de Federico Fellini. Mas o fato de ser dirigido por uma mulher empenhada na expressão das contradições femininas faz do filme um jogo de espelhos: o desejo das internas é mediado pelo desejo do interventor, que por sua vez é mediado pela visão estética e crítica da cineasta.
Dito isso, só resta embarcar no fluxo de imagens inesperadas, quase sempre em aparente descompasso com o texto dos diálogos e com o tom em que são ditos. Há um constante deslocamento semântico, em que os clichês -verbais ou visuais -ganham novos sentidos ao mudar de contexto.
Não é por acaso que Ana Carolina batiza seus filmes com frases-feitas ("Mar de Rosas", já lançado em DVD; "Sonho de Valsa", "Das Tripas Coração").
Seu cinema se constrói em grande parte da reelaboração desse repertório básico, desse patrimônio afetivo comum.
Um exemplo singelo: ao se sentir "pego para Cristo", o interventor toma o lugar do próprio no crucifixo.
Faltou falar do excelente e heterogêneo elenco feminino, que inclui Miriam Muniz, Xuxa Lopes, Nair Belo, Célia Helena e Cristina Pereira.
Nos extras, um documentário de Evaldo Mocarzel para a série "Retratos Brasileiros", do Canal Brasil, traz a própria Ana Carolina comentando sua obra.


DAS TRIPAS CORAÇÃO
Direção:
Ana Carolina
Distribuidora: Videofilmes (R$ 45, em média)
Avaliação: ótimo


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