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Crítica/"Das Tripas Coração"
Ana Carolina expõe as contradições da sexualidade
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Em "Das Tripas Coração" (1982), de Ana Carolina, que chega agora
em DVD, tudo acontece num
colégio católico de moças prestes a ser vendido e demolido.
Enquanto espera as diretoras
da escola na sala de reuniões, o
interventor designado para liquidar o negócio (Antonio Fagundes) cochila e tem sonhos
malucos com as alunas, professoras e serventes.
Poderia ser apenas um pesadelo machista, à maneira de "A
Cidade das Mulheres", de Federico Fellini. Mas o fato de ser
dirigido por uma mulher empenhada na expressão das contradições femininas faz do filme
um jogo de espelhos: o desejo
das internas é mediado pelo desejo do interventor, que por sua
vez é mediado pela visão estética e crítica da cineasta.
Dito isso, só resta embarcar
no fluxo de imagens inesperadas, quase sempre em aparente
descompasso com o texto dos
diálogos e com o tom em que
são ditos. Há um constante deslocamento semântico, em que
os clichês -verbais ou visuais
-ganham novos sentidos ao
mudar de contexto.
Não é por acaso que Ana Carolina batiza seus filmes com
frases-feitas ("Mar de Rosas",
já lançado em DVD; "Sonho de
Valsa", "Das Tripas Coração").
Seu cinema se constrói em
grande parte da reelaboração
desse repertório básico, desse
patrimônio afetivo comum.
Um exemplo singelo: ao se sentir "pego para Cristo", o interventor toma o lugar do próprio
no crucifixo.
Faltou falar do excelente e
heterogêneo elenco feminino,
que inclui Miriam Muniz, Xuxa
Lopes, Nair Belo, Célia Helena
e Cristina Pereira.
Nos extras, um documentário de Evaldo Mocarzel para a
série "Retratos Brasileiros", do
Canal Brasil, traz a própria Ana
Carolina comentando sua obra.
DAS TRIPAS CORAÇÃO
Direção: Ana Carolina
Distribuidora: Videofilmes (R$ 45, em
média)
Avaliação: ótimo
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