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Conheça Brad Mehldau,
the next big thing do jazz
Pianista, 28, é comparado a grandes solistas como Bill Evans e Glenn Gould, cita Shakespeare, Rousseau e Goethe, está em trilha de filme de Kubrick e vem ao próximo Free Jazz
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CARLOS CALADO
especial para a Folha
A história se repete. Os europeus andam encantados por um
jazzista norte-americano que ainda é pouco conhecido em seu
próprio país. Brad Mehldau, 28,
está sendo apontado como a nova
sensação do gênero.
Na Itália, onde já virou ídolo, os
críticos o comparam a grandes
solistas do piano, como Bill Evans
e Glenn Gould. Lembrar de Keith
Jarrett também é comum, ao vê-lo retorcido sobre o piano.
Outra característica de Mehldau que atrai os europeus é sua
incomum inclinação intelectual.
Ele chega a citar Shakespeare,
Rousseau e Goethe, tanto em entrevistas como em textos que incluiu no encarte de seu CD.
Os brasileiros já o ouviram ao
vivo uma vez, no Free Jazz de
1991, ao lado do saxofonista
Christopher Hollyday -a organização do festival promete trazê-lo de novo no ano 2000. Além disso, sua música "Blame it on My
Youth" faz parte da trilha do filme
"De Olhos Bem Fechados", de
Stanley Kubrick, atualmente em
cartaz no Brasil.
Mas a carreira do rapaz decolou
apenas em 1995, ao gravar o primeiro disco como líder, depois de
acompanhar Joshua Redman.
Mehldau falou à Folha durante
a recente edição do festival Umbria Jazz (em Perugia, na Itália),
no qual se apresentou pelo terceiro ano consecutivo -outro índice de seu enorme prestígio.
Folha - Como você encara a
pressão de ser apontado como a
"next thing", a última novidade
na cena do jazz?
Brad Mehldau - Acho que a melhor atitude é não dar importância a isso, porque qualquer coisa
considerada nova, por natureza,
vai ser vista como velha algum
dia. Se você entra nessa história, já
compra a certeza de envelhecer.
Folha - Você vê uma relação
entre seu interesse simultâneo
por música e literatura?
Mehldau - Acho que a música e
a literatura transmitem a você o
sentido de sua própria mortalidade, a sensação do tempo passando, algo que eu não sinto na pintura, por exemplo. O que eu mais
aprecio na arte é que ela permite a
você pensar na sua mortalidade
de uma maneira um pouco mais
confortável. E a música oferece
essa possibilidade como nenhuma outra arte, porque ela é a representação direta de algo mortal.
No jazz, quando você realmente
improvisa, cria algo que vai ter de
esquecer para seguir adiante.
Folha - É sabido que você admira o crítico literário Harold
Bloom, que já escreveu sobre a
angústia da influência. Como
você lida com a ascendência de
outros músicos sobre seu estilo?
Mehldau - Sim, Harold Bloom
escreveu sobre a idéia de que você
sempre sente estar chegando tarde demais, porque muita coisa já
foi feita antes. Ele fala sobre poetas, mas acho que isso se aplica a
qualquer artista. Você tem de
amar o que veio antes de você,
mas precisa "ler errado" para poder fazer algo diferente.
Folha - Aconteceu com você?
Mehldau - No meu caso, as influências vêm tanto do jazz como
da música clássica. Num certo
momento, você pára de fazer um
pastiche de suas influências e
mergulha em si mesmo. Como isso acontece é um mistério.
Comigo esse processo começou
a se desenvolver há uns quatro ou
cinco anos, quando toquei com
Joshua Redman. Passei a me
preocupar em como poderia me
afastar de McCoy Tyner, Bill
Evans ou de quem quer que fosse.
Folha - Algum músico, em particular, já o fez sentir angústia
por sua forte influência?
Mehldau - Não, nenhum em
particular. Acho que no jazz de
hoje não há mais uma linhagem
direta. Você pode apanhar coisas
de onde quiser. O jazz vive se reinventando, ao tomar coisas de outras culturas, como a latina.
Folha - Falando em influência
brasileira, em seu concerto a
dois pianos com Kenny Barron,
no Umbria Jazz, vocês tocaram
"Manhã de Carnaval", de Luiz
Bonfá. Foi escolha sua?
Mehldau - Foi idéia de Kenny,
mas eu já a tinha tocado anos
atrás. É uma canção muito bonita.
O que eu mais gosto na tradição
musical brasileira é a harmonia.
Ela costuma ser muito rica e tem
uma forte influência européia.
Folha - O que você acha da
idéia de que o jazz vai se transformar em uma espécie de música clássica no futuro?
Mehldau - Eu espero que isso
não aconteça. Acho que a noção
de que houve um renascimento
do jazz, nos anos 80, deu às pessoas uma idéia errada. Sem dúvida, houve um ressurgimento de
interesse pelo jazz e os músicos
voltaram a ser valorizados e passaram a tocar em lugares melhores. Gente como Wynton Marsalis até ajudou a educar o público,
mostrando que essa música é séria.
Mas não concordo com a concepção de que houve uma espécie
de antiguidade do jazz e que os
anos 70 foram a era das trevas que
precedeu o renascimento. O jazz
nunca parou. Essa idéia sugere
que estamos numa fase derradeira do jazz, como se ele fosse acabar. Não gosto de termos históricos arcaicos sendo aplicados a
uma música que está em processo
constante de desenvolvimento.
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