São Paulo, quarta-feira, 30 de outubro de 2002

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ARTIGO

Globo viveu perigosamente

XICO SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

A Globo desceu ao purgatório na tentativa de queimar dos seus arquivos, em uma espécie de incêndio cívico proposital, um passado cuja traquinagem mais emblemática dos seus prestidigitadores foi a edição do debate entre Fernando Collor de Mello e Luiz Inácio Lula da Silva, em 89.
Na campanha eleitoral, foi atacada não mais pelo PT do presidente eleito -nos comitês do partido sobraram perdão e elogios-, mas por um choroso PFL, inconformado com o incansável replay da dinheirama da Lunus, caso fatal para a pré-candidatura de Roseana Sarney, a "número 1".
Nesse momento, os aliados de Roseana insinuaram que a Globo estava a serviço da sua velha vocação governista, desta feita na companhia de José Serra. Sabatinado, mais tarde, pelo casal William Bonner e Fátima Bernardes, no "Jornal Nacional", o tucano foi acossado por perguntas nunca dantes feitas a candidatos oficiais.
Na rotina do "JN", uma agenda fria, com tempos iguais para Lula, Serra, Ciro e Garotinho. As falas, quase sempre, ao sabor do chuchu que predominava nas entrevistas coletivas. A não ser que o candidato insistisse mesmo em boutades à quente, como Ciro.
O congelador do noticiário, no qual não cabiam gafes ou democráticos ataques aos adversários, foi uma linha auxiliar dos marqueteiros -"o que é bom a gente mostra, o que é ruim a gente esconde". Parabólica para todos.
Estava embutido aí, uma vez que a pessoa jurídica em questão também tem inconsciente, a síndrome de 89. Em um ano delicado para as Organizações Globo: a família Marinho havia recorrido a empréstimos no balcão governista do BNDES. Operação que contou com o silêncio petista.
Mais adiante, na semana da eleição em primeiro turno, outro lance complicado, quando o lobby global triunfou com a edição de uma medida provisória, obra de FHC, que regulamentou a participação do capital estrangeiro nas empresas de comunicação. O coro dos contrários calou. O resto é indecifrável. A Globo foi isenta, como louva um anúncio, ou adaptou, em transição avexada e autoprotetora, o seu código de bom-tom ao novo possível poder?
O maior enigma, no entanto, foi soprado pelo empresário Antonio Ermírio de Moraes, à Folha: "A saída do ex-presidente da Petrobrás Philippe Reichstul da Globo é um mau sintoma para Serra. Desmontou a máquina. Entendi que estava montado um esquema de apoio a ele". Pelo bem ou pelo mal, códigos do purgatório, este ano a Globo viveu um ano e tanto.


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