São Paulo, Terça-feira, 30 de Novembro de 1999


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COMÉRCIO X CULTURA
Debate une políticos e artistas na França

FÁTIMA GIGLIOTTI
de Paris


Com a proximidade da abertura do ciclo de negociações da OMC em Seattle (EUA), a França transformou a questão da diversidade cultural numa batalha pela soberania nacional.
O problema uniu no mesmo credo o presidente Jacques Chirac (do RPR, Reunião pela República, direita) e o primeiro-ministro Lionel Jospin (socialista).
Desde 1993, é o país quem levanta a bandeira da diversidade cultural na Europa. "A França crê que a defesa da língua e a promoção da cultura não devem seguir a mesma regulamentação do mercado comercial", disse à Folha Eli Cohen, diretor da Sociedade Nacional de Pesquisa Científica.
Rostos conhecidos como os da atriz Juliette Binoche (Oscar de coadjuvante por "O Paciente Inglês") e o do cineasta Bertrand Tavernier ("A Isca") entraram na briga para defender o protecionismo cultural.
Resultado: a União Européia (UE) não apenas adotou o princípio como vai defendê-lo em Seattle. O representante da UE na OMC, Pascal Lamy, declarou que a União Européia buscará garantir a possibilidade de a comunidade "definir e desenvolver ações políticas culturais e audiovisuais para preservar sua diversidade cultural".
Para obter a adesão da UE, a França precisou relaxar sua posição. Antes, nem aceitava discutir com outros países suas políticas culturais (o chamado princípio da exceção cultural). Agora, aceita um regime especial (princípio da diversidade cultural), mas, internamente, ainda defende a política de exceção. "A cultura não é negociável", diz François Huwart, secretário do Estado de Comércio Exterior.
A França adota uma série de medidas de incentivo à cultura local, como sistemas de cotas de difusão, de auxílio à produção e à criação. Só na área do audiovisual, há 27 programas de incentivo -que vão do roteiro à distribuição. "O país não quer se desfazer desse aparelho de apoio à cultura nacional para que ela seja regulada apenas pelo mercado", diz o pesquisador Cohen.
Na prática, a bandeira da diversidade cultural significa defender protecionismo para os bens culturais. O presidente Chirac disse em uma reunião com 200 artistas que, "na Europa, a média de filmes americanos no cinema e na televisão é superior a 60% do total exibido, contra 3% no sentido inverso". Por outro lado, o comércio mundial de bens culturais triplicou entre 1980 e 1995, passando de US$ 67 bilhões a US$ 200 bilhões, informa a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura).
A ministra da Cultura francesa, Catherine Traumann, afirmou em uma conferência na Unesco que "os bens culturais são essenciais à preservação da identidade dos povos. Eles veiculam valores, idéias e sentidos. Sua especificidade deve ser reconhecida, eles não são mercadorias como as outras".
Segundo dados do ministério da Cultura francês, em 1998, dos filmes exibidos na França, 63,5% eram de produções americanas, e 27,4 %, francesas. Entre os exportadores de audiovisual, a França ocupa a quinta posição, atrás dos EUA, Canadá, Austrália e Reino Unido.
São números como esses que servem de justificativa para os defensores da diversidade cultural.
"Um filme ou um livro não são produtos como os outros, são vetores da cultura francesa, da nossa língua", afirmou o cineasta Cédric Klapisch, um dos mentores da "Declaração de Bastia".


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