CARLOS CALADO
especial para a Folha

Num país com uma história musical marcada por tantas cantoras de qualidade, não é fácil para uma intérprete soar original. Mais difícil ainda é conduzir a carreira sem apelar para modismos ou receitas padronizadas.
"Voadeira", o segundo CD individual da paulistana Mônica Salmaso, 28, confirma sua rejeição ao sucesso popularesco medido em milhões de discos, que vem orientando o mercado fonográfico com consequências nefastas.
Revelada há apenas quatro anos, com um belo CD dedicado a afro-sambas que gravou ao lado do violonista Paulo Bellinati, Mônica soa hoje como uma intérprete madura, dona de uma forte personalidade musical.
Sua peculiar voz de contralto, com um timbre opaco, parece envolver as canções que interpreta com uma fina camada de melancolia. Nada a ver, portanto, com as vozes metálicas de linhagem carnavalesca, que viraram padrão de mercado. Dividindo a direção musical com o produtor e contrabaixista Rodolfo Stroeter, Mônica acerta ao escolher, mais uma vez, formações camerísticas. Com voz privilegiada, ela não precisa se apoiar em orquestras ou arranjos complexos.
O clarinete de Proveta e a percussão de Marcos Suzano não poderiam soar mais apropriados, ao acompanhá-la na versão minimalista do samba "Minha Palhoça" (de J. Cascata). Assim como o baixo acústico de Stroeter foi uma escolha perfeita para sublinhar a dramaticidade contida de "Beradêro" (Chico César).
No repertório de "Voadeira", Mônica mistura diversos gêneros da música popular brasileira, do xote ("A Violeira", de Jobim e Chico Buarque) ao samba-enredo ("Ilu-Ayê", de Cabana e Norival Reis), passando até pela modinha ("Senhorinha", de Guinga e Paulo César Pinheiro).
Só que, em vez de posar de cantora eclética, para exibir versatilidade (ou apenas agradar a gregos e troianos), ela prefere adaptar esses gêneros a seu estilo intimista de interpretação. Assim, fez um disco original e requintado. Talvez não seja um sucesso popular, mas certamente estará nas listas de melhores do ano.

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