São Paulo, sexta-feira, 30 de novembro de 2001

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CINEMA/"EL MAR"

Villaronga realiza um completo vexame

TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA

Entre seus conterrâneos espanhóis, Agustín Villaronga cultivou, com seus primeiros filmes, a fama de cineasta maldito.
Villaronga deitou na cama, mas, quando o dinheiro faltou, não hesitou em fazer sua "rentrée" no circuito como diretor de thrillers.
O sucesso da capitulação garantiu-lhe o financiamento da adaptação do romance do também maiorquino Blai Bonet. Realizado com a ajuda do produtor Paulo Branco, "El Mar" consolidaria a carreira do diretor, se não se revelasse um completo vexame.
Num sanatório para tuberculosos, três amigos marcados por uma tragédia de infância se reencontram. Ramallo, contrabandista obrigado a manter relações sexuais com o patrão, é o homem dos instintos, aprisionado ao poder de suas pulsões. Tur, o tuberculoso, é o reprimido, falso beato obcecado pelo amigo e pelo passado. E Francisca é a bela angelical que se tornou freira não para servir a Deus, mas às pessoas.
Villaronga nos apresenta seus protagonistas, no início, como típicos personagens do cinema moderno, isto é, como "órfãos de guerra" (a Guerra Civil Espanhola, no caso) meio anjos, meio demônios que, em sua guerra particular com a vida, perdem-se na fronteira além do bem e do mal.
O fato de efetivar essa apresentação por um flashback e de usá-la para delinear o perfil psicológico dos personagens demonstra que o cineasta não ficou indiferente ao sucesso e à segurança que o esquema batido dos thrillers lhe proporcionou. "El Mar" desenrola-se em sua eterna promessa de "mais a ver", de acordo com o velho esquema clássico de suspense.
O problema não é que Villaronga queira rezar pela cartilha comercial hollywoodiana. Alejandro Amenábar, por exemplo, soube capitular sorrindo: seu "Os Outros" prima pela economia na abordagem do mesmo esquema.
Ao contrário de Amenábar, Villaronga peca pelo excesso, como um mau diretor de filmes B de horror, um Dario Argento sem talento. Pretensioso, busca numa simbologia um tanto duvidosa e barata um meio de transcender a dinâmica sensório-motora do esquema hollywoodiano e acaba por banalizar motivos já banalizados pelo cinema, como a obsessão de Tur pela cruz e a de Ramillo, "o náufrago", pelo silêncio imenso do mar, "sentimento oceânico" que é, em si mesmo, religioso.


El Mar
El Mar
 
Direção: Agustín Villaronga
Produção: Espanha, 1999
Com: Bruno Bergonzini, Roger Casamajor, Antonia Torrens
Quando: a partir de hoje no Espaço Unibanco e no Unibanco Arteplex




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