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RELÂMPAGOS
Línguas
JOÃO GILBERTO NOLL
Sua voz não parece mais legível. Ontem pediu um copo
d'água à filha. Ela lhe trouxe a
foto de uma mulher meio esquiva. Tirada quando ele trabalhava de garçom na Califórnia. Vieram-lhe fiapos da
mexicana. Ainda conseguia
se lembrar da noite em que,
entre o inglês, o espanhol e o
português, as palavras começaram a lhe faltar. A mexicana disse que o mesmo ocorria
com um irmão. Que eram
tantas as palavras, de tão diferentes fontes e sabores, que
concentravam em si tamanha
quantidade de matizes e sentidos, que alguns como eles
dois já não conseguiam guardá-las. Que estes, ao chegaram numa idade, só sabiam
apresentar um arrazoado de
sons impenetráveis à volúpia
comum do entendimento. "E
assim é", ela suspirou mirando os pés descalços.
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