São Paulo, Sábado, 31 de Julho de 1999
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CRÍTICA
Sobrevida ao blues

da Redação

Apesar de ter em seu catálogo músicos como Albert Collins, Lonnie Brooks e Johnny Winter, a Alligator reestréia no país com três lançamentos da série "Deluxe Edition" que, apesar de não terem o mesmo reconhecimento daqueles registrados pelos artistas do começo deste parágrafo, traduzem bem o estilo da gravadora.
Sempre com um pé fincado na tradição, o gaiteiro William Clarke, a pianista Katie Webster e o guitarrista Hound Dog Taylor dão dicas do que pode ser feito para dar sobrevida ao blues.
Com forte influência dos sons das big bands jazzísticas, Clarke (1951-1996) era apontado como o sopro do futuro até que um ataque cardíaco pôs fim à sua carreira. As 16 faixas do CD "Deluxe Edition" dedicado a ele deixam isso claro.
Forte, vigoroso e cheio de combinações inusitadas, o fraseado nos solos do gaiteiro escapa da ditadura iniciada pela gaita de Little Walter e põe em campo as sutilezas de George "Harmonica" Smith.
Somado ao vocal rouco e reticente no final das frases, o sopro de Clarke compõe um mosaico de idéias extraídas de outros espectros musicais, mas que se amoldam aos quadrantes do blues sem perder ou roubar a identidade.
Não há faixas que mereçam estar de fora da coletânea, cujo único defeito é ter deixado de fora o resto da obra do gaiteiro.
Se o catálogo da Alligator é eclético, a pianista e cantora Katie Webster, 60, é a artista mais eclética do catálogo, como provam as 15 faixas da "Deluxe Edition".
Alguns estilos expostos no disco ainda nem passaram por uma catalogação definitiva. Só para dar alguns exemplos, há faixas de boogie-woogie, rhythm and blues típico de Nova Orleans e soul com viés gospel. É claro que o blues permeia isso tudo.
E não é só da variedade que resulta o interesse no CD de Webster. Ela é uma pianista competente e, sobretudo, dona da voz feminina mais penetrante dedicada ao blues.
Para fisgar aqueles que ainda não conhecem o trabalho da cantora, a coletânea acerta ao abrir com "Two Fisted Mama", música dona de uma sensualidade brejeira e um balanço capaz de unir avô e neto na mesma pista de dança.
Daí para a frente, a variedade domina. Com um dom quase enciclopédico para passear por estilos, Webster executa suas canções com a autoridade de quem não precisa provar nada a ninguém, além de si mesma.
Quando o assunto é Hound Dog Taylor (1915-1975), é preciso que o ouvinte de blues seja um iniciado com alguns anos de contato frequente com esse tipo de música.
Tocada sem contrabaixo, com guitarras baratas japonesas e amplificadores comprados em lojas de departamento, a música de Taylor é crua, rústica, distorcida e dona de um suingue contagiante.
Não tem jeito, os novos fãs de blues vão precisar de algum treino para descobrir a riqueza de uma música em que a afinação é mero adereço. Superado esse obstáculo, o ouvinte passa a descobrir que Taylor é um músico para o qual vale a pena montar uma gravadora.
Para os veteranos, o CD traz duas inéditas. Uma delas é um registro ao vivo de "Phillips" Theme", faixa em que o guitarrista de apoio Brewer Phillips mostra como vale a pena ser apoiado por ele.

Novos
Depois da primeira fornada, a Abril já está trazendo mais três títulos da Alligator. Esse pacote, formado por três CDs, vai contemplar os últimos trabalhos de músicos da safra mais recente de estrelas do selo de Chicago.
Trata-se dos mais recentes discos do grupo Kinsey Report ("Smoke and Steel"), da cantora Shemekia Copeland ("Turn the Heat Up") e do violonista Corey Harris ("Greens from the Garden"). (EF)


Avaliação:      (Katie Webster) e     (Hound Dog Taylor e William Clarke)


Discos: Deluxe Edition, de Katie Webster, Hound Dog Taylor e William Clarke
Lançamento: Abril Music Quanto: R$ 18, em média, cada CD





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