|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
RELÂMPAGOS
Beijo na seda
JOÃO GILBERTO NOLL
Ela estava ali, à procura de
uma cadeira para comprar,
rondando como sempre
meio tonta em busca do utensílio que a pudesse remediar a
tempo, mesmo que não soubesse exatamente o que significava ser remediada a tempo
-aliás, as palavras iam perdendo pouco a pouco a transparência que seu pai recomendava: "A frase deve assoprar a névoa que confunde
para que possa haver verdadeiro alívio à noite: a cabeça
enfim no travesseiro, já quase
divorciada do verbo, até que a
claridade traga mais uma vez
as sílabas, essas operárias das
idéias, transações, freios".
Num súbito, ela se sentou. De
surpresa, beijou o forro adamascado do espaldar como se
ela fosse um instinto sem a
capa da epiderme, pura flora
de nervos, voraz. Uma criança a observava com tenacidade. Feliz...
Texto Anterior: Mônica Bergamo Próximo Texto: Festival de Veneza: Clint Eastwood filma terceira idade no espaço Índice
|