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Ang Lee esquenta Festival de Veneza
Após o premiado "Brokeback Mountain", cineasta retorna com violência e erotismo, em "Lust, Caution"
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
O contraste foi interessante.
Após uma abertura morna,
com os meios-tons do insosso
"Desejo e Reparação", de Joe
Wright, o Festival de Veneza
esquentou ontem com "Lust,
Caution" (luxúria, precaução),
de Ang Lee.
Ambos são filmes de época
adaptados de fonte literária,
majoritariamente bancados
por um grande estúdio americano (Universal). Mas os resultados, opostos, são o reflexo do
talento de seus diretores.
Apesar da elaborada reconstituição da China dos anos 40,
Ang Lee não deixa cenários e figurinos se sobreporem à força
da narrativa, de alto teor violento e erótico. De volta a Veneza dois anos após ter recebido o
Leão de Ouro por "O Segredo
de Brokeback Mountain", ele
confirma o desejo de exercitar a
versatilidade experimentando
um gênero inédito em sua carreira (o thriller político). No
fundo, porém, não se afasta daquilo que realmente domina:
"Lust, Caution" está agarrado
às raízes do melodrama e das
histórias de amor impossíveis.
A ação se passa na China dos
anos 40, sob a violenta ocupação japonesa. Com o objetivo
de arrancar informações para
um grupo de resistência, a jovem Wong Chia Chi (Tang Wei)
aproxima-se do senhor Yee
(Tony Leung), colaboracionista
do governo japonês.
O filme só decola quando, entre os dois, surge uma relação
erótica, filmada de forma quase
explícita, em cenas que deram o
que falar. A violência também
explode de forma brutal, como
em nenhum outro filme de Lee.
É possível que o teor de
"Lust, Caution" cause problemas para o lançamento na China. Jornalistas apostaram, em
Veneza, que ele não será liberado sem cortes no país -se não
for proibido. Nos EUA, foi proibido para menores de 17 anos.
Na concorrida entrevista coletiva do filme, Lee disse não se
importar com os riscos. "O que
me interessava era a complexidade do desejo sexual e a relação ambígua entre os personagens. Filmei como achei necessário para contar isso."
Nascido em Taiwan -país
que tem uma difícil relação política com a China- e criado
nos EUA, Lee contou que seu
novo trabalho representou
uma aproximação às suas origens de forma mais realista.
"Com o filme, descobri um país
distante da China romântica
contada por meus pais."
Nova versão
Outro thriller, de natureza
muito diferente, completou os
filmes em competição ontem: o
britânico "Sleuth", de Kenneth
Branagh, narra o embate psicológico entre um homem mais
velho, escritor de policiais, e o
amante de sua mulher, um ator.
"Sleuth" (detetive), é, na verdade, uma nova versão para o
cinema de uma peça de Anthony Shaffer (roteirista de "O
Homem de Palha"), adaptada
pela primeira vez em 1972 pelo
mestre Joseph L. Mankiewicz.
A nova versão traz uma divertida revisão de papéis: Michael Caine, que em 1972 interpretou o jovem amante, contracenando com Laurence Olivier,
assume agora o papel do escritor enciumado, enquanto Jude
Law, que há pouco viveu um
personagem criado por Caine
em "Alfie", vive o jovem ator.
"Sleuth" tem seu ponto forte
no roteiro, assinado pelo dramaturgo Harold Pinter. Se o filme original tinha mais de duas
horas e vários personagens, o
novo é bem mais concentrado,
com menos de 90 minutos de
um diálogo afiado entre machos feridos. "Pinter transformou a obra completamente, e
só por isso me interessei em fazer. Não vejo sentido em remakes", disse Michael Caine.
O jornalista PEDRO BUTCHER se hospeda a convite do Festival de Veneza.
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