|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Cinema/estréia
Longa troca tráfico pela família
Derivado de "Cidade de Deus", filme "Cidade dos Homens" busca "caminho humano", afirma diretor
Título, que estréia hoje, encerra história da série exibida na Globo; para diretor, o programa foi "cinema que passou na TV"
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
O longa-metragem "Cidade
dos Homens", de Paulo Morelli,
que estréia hoje em 160 cinemas, conclui a trajetória que os
garotos Laranjinha (Darlan
Cunha) e Acerola (Douglas Silva) percorreram na Globo, de
2002 a 2005, em série derivada
do filme "Cidade de Deus"
(2002), de Fernando Meirelles,
sócio de Morelli na O2 Filmes.
"A série foi cinema que passou na TV e volta agora para o
cinema, sendo cinema", afirma
Morelli. Se o parentesco com o
título do sócio era óbvio, Morelli diz que "o desafio de "Cidade
dos Homens" era não fazer um
"Cidade de Deus - Parte 2", porque isso era o que eu e Fernando [Meirelles] não queríamos".
A alternativa do diretor foi
"buscar o caminho humano",
em detrimento do retrato do
tráfico de drogas e da violência
descrito em "Cidade de Deus".
Os temas da amizade e da família -e seus conflitos- saltaram ao centro da trama de "Cidade dos Homens". No entanto, a presença do tráfico está
longe de ser acessória no filme.
A guerra entre os bandos de
Madrugadão (Jonathan Haagensen) e Nefasto (Eduardo
BR) ocupa boa parte das cenas e
move os acontecimentos que
acuam Laranjinha e Acerola a
um aparente beco sem saída,
quando põem em xeque a própria amizade.
Morelli afirma que, mais do
que "ser legítimo usar a questão do tráfico" como pano de
fundo da história dos moradores da favela, ele "seria omisso"
se não o fizesse.
"Nunca tinha entrado numa
favela, até decidirmos fazer a
série "Cidade dos Homens", já
pensando no filme como encerramento dela. Fiz dezenas de
entrevistas com moradores.
Todas esbarravam no tráfico,
mesmo que eu não perguntasse
nada a respeito. Estou sendo
fiel a tudo que ouvi", diz.
O diretor desenvolveu o roteiro com Elena Soárez ("Eu,
Tu, Eles"). A primeira coisa que
os dois definiram foi a cena final, que consagra um núcleo familiar não-convencional como
desfecho para os dilemas em
torno da paternidade que atormentam Laranjinha e Acerola
ao longo do filme.
Laranjinha parte em busca
do pai, que desconhece; enquanto Acerola resiste à responsabilidade de criar o filho. O
percurso é recheado por cenas
em "flashback" exibidas na série, em que "essa questão foi
plantada, já pensando no longa", segundo o diretor.
Morelli diz que "a temática
da paternidade, do legado, daquilo que se se deixa e de por
que se é lembrado" é o tema
que pretende trabalhar "de
agora em diante". Ele tem três
sinopses já engatilhadas e pretende chegar a um conjunto de
sete roteiros sobre o tema.
Em "Cidade dos Homens", ao
retratar a ausência da figura paterna e o desconhecimento de
sua identidade, Morelli se baseou numa experiência comum
aos intérpretes dos protagonistas e à maioria dos jovens que
ele conheceu na favela.
"Até hoje a gente sente muita
necessidade de ter um pai.
Quando a gente tinha 16 anos,
no Dia dos Pais a gente foi para
a igreja e chorou que nem
criança", conta Darlan.
Na opinião dos atores, o final
feliz com a família não-convencional que o filme propõe não é
suficiente na prática. "Acho
que outra pessoa não pode suprir a falta da mãe ou do pai. Isso sempre vai ter um reflexo na
vida de uma criança", diz Douglas, que está noivo há dois
anos e pretende se casar em
breve. "Sempre quis ter um filho, a minha família", diz.
Morelli avalia que "o Brasil é
um país muito irresponsável,
em que as pessoas vão tocando
o barco numa voracidade e sem
pensar nas conseqüências",
mas diz que, em "Cidade dos
Homens" e nos próximos longas que pretende fazer em torno da paternidade, não pretende "dizer como deve ser, mas
mostrar como tem sido".
Texto Anterior: Ang Lee esquenta Festival de Veneza Próximo Texto: Crítica: Filme tropeça ao enfocar paternidade Índice
|