...E foi para a Internet, via MP3, como o último álbum do Public Enemy e o primeiro do duo eletrônico paulistano Bojo

MARCELO NEGROMONTE
da Redação

Bem-vindo ao Terrordrome Parte 2. Agora digital e mais letal do que nunca. Um dos maiores grupos de rap que já existiram, o Public Enemy, afia a língua e dispara petardos contra gravadoras, policiais, rádios e jabaculês via MP3, a2b, zip e CD como nenhuma outra banda ousou.
O último álbum do Public Enemy, "There's a Poison Goin On..." (referência óbvia a "There's a Riot Goin" On" -71-, de Sly & The Family Stone), é o primeiro de uma banda comercialmente estabelecida a ser lançado exclusivamente pela Internet. Um mês antes de o CD chegar às lojas, era possível comprar, por US$ 8, o álbum inteiro -ou US$ 0,99 cada uma das 14 faixas em separado- nos formatos MP3 e a2b, este da AT&T, arquivos digitais rapidamente "baixáveis" para o disco rígido do seu computador.
Um soco na linha da cintura da indústria fonográfica: um artista tomando conta do seu próprio negócio e atirando contra ela. Lançado pelo web-selo Atomic Pop, "There's a Poison Goin On..." inaugura "o faça você mesmo" -e seja bem-sucedido- da atual era digital.
Depois do rompimento do contrato com sua antiga gravadora, a Def Jam, justamente devido a uma música posta no ar em MP3, o líder do PE, Chuck D, se transformou numa espécie de porta-voz do MP3, ou de qualquer outro meio que "liberte o artista da dominação das gravadoras".
Fez o que quis, disse o que bem entendeu, distribuiu para o mundo inteiro e está rindo por último com outras incursões pela Web.
Se você está lendo este texto na Internet, vá ao www.publicenemy.com ou www.atomicpop.com e descubra por si mesmo os estragos causados por músicas como "Swindler's Lust", "Do You Gonna Go Our Way???" (primeiro single) e "Crayola".
Sem lançar um disco desde a trilha sonora de "He Got Game" (97), filme de Spike Lee -e a primeira trilha sonora composta em sua totalidade por uma banda de rap-, o Public Enemy começa "There's a Poison" com uma colagem de sons de "Fear of a Black Planet" (90), um dos melhores -senão o melhor- álbuns de rap desta década.
"Do You Gonna Go Our Way???", sombria, maléfica, intima o ouvinte: "Você topa o nosso jeito?/ esse é o jeito que detonamos". E faz referências às mortes de Kurt Cobain, Tupac Shakur, e Notorious B.I.G, deixando às claras os responsáveis: a indústria.
"Mentira por mentira, eu os encaro (advogados de gravadoras) nos olhos", vocifera Chuck D em "LSD", uma das melhores do álbum: funky e pesada. O baixo é anabolizado mais ainda em "Kevorkian", sobre uns certos "doutores da morte". Uau!
O alopradinho Flavor Fav canta em duas músicas, "41:19" (sobre o assassinato do imigrante negro Amadou Diallo, no qual, este ano, policiais nova-iorquinos atiraram 41 vezes e cravaram 19 balas), a "911 Is a Joke" desse álbum, e "What What", a mais divertida e apolítica do disco, com backing vocals femininos meio sacanas.
"Swindler's Lust" (algo como a cobiça do vigarista, trocadilho com "Schindler's List") é diretaça: "Se você não domina o mestre, o mestre domina você" e não faz metáforas quanto à "exploração de artistas negros por gravadoras desde os anos 50".
Detalhe curioso: não há aquele selinho típico das capa de discos norte-americanos quando há palavrões no seu interior em "There's a Poison Goin On...".
Não há espanto nenhum, portanto, com o fato de um grupo de rap -e que este seja o Public Enemy, um dos primeiros grupos politicamente engajados do gênero- ser o pioneiro a utilizar o MP3 e a distribuição de música pela Internet, a mídia para a música no próximo século.
A "Amerikkka" ainda vai agradecê-los por desbravar esse admirável mundo novo digital.

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