São Paulo, terça-feira, 31 de dezembro de 2002

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Artista lança manifesto do "pós-japonismo"

DE PARIS

Os franceses, que adoram o cinema de Kitano, finalmente puderam estar diante de suas pinturas na exposição "Coloriages", apresentada recentemente na Fundação Cartier para a Arte Contemporânea. Nas telas, parecidas com as que mostrou no filme "Hana-Bi", vive um mundo em que flores e animais se confundem nas figurações que não sabemos se são kitschs, ingênuas ou delicadamente perversas.
A exposição foi também uma oportunidade de ver programas de auditório absurdos que Kitano faz no Japão. Mas não era exclusivamente a exibição de trabalhos do diretor. Reuniu mais de 50 artistas e designers japoneses, de várias procedências e técnicas, para oferecer um panorama da nova arte contemporânea no país.
Panorama polêmico e complexo, pois, além de atrações da TV, não dispensou como exemplos de criação artística no país pokémons e digimons, mangá, jogos da Nintendo, robôs e bichos de plástico. "A idéia de subcultura é estranha ao Japão. Os "mangakas" (desenhadores de mangá) são considerados por lá artistas completos", declarou ao "Libération" o artista plástico Takashi Murakami, 40, curador de "Coloriages".
Murakami é uma estrela da cultura japonesa, um artista controverso bastante influenciado por Andy Warhol. Junto com "Coloriages", ele apresentou na mesma fundação a exposição "Kaikai Kiki", com seus trabalhos recentes.
Kaikai e Kiki são dois divertidos personagens por ele criados e que ilustram as telas da sua exposição -ora pequenos quadros dispostos em série, ora enormes murais, pintados em acrílico, e recheados de flores, olhos e figuras infantilizadas que lembram mangá.
Murakami aproveitou a exposição para lançar uma espécie de manifesto do "pós-japonismo". O japonismo foi a onda de interesse pela arte japonesa que se espalhou no século 19 pelo Ocidente. A própria arte japonesa deixou-se influenciar pela ocidental a partir desta época, como demonstra o termo "coloriage" (colorização). É a tradução de "nurie", processo utilizado pelos japoneses de preenchimento dos contornos de uma obra copiada do Ocidente.
Para Murakami, esse período terminou. Leia um trecho de seu "manifesto": "Após a derrota na Segunda Guerra, o Japão foi culturalmente bombardeado pelo vencedor americano. Os traços do contorno se tornaram mais espessos, a influência americana e européia se acumularam para estruturar, do exterior, a cultura e a arte japonesas. Mas nestes dez últimos anos, o charme do "coloriage" deixou progressivamente de agir sobre o mundo da arte. Hoje criamos novos contornos, talvez desordenados, mas que nos são próprios e que não provêm das "belas-artes" ocidentais. Esse novo movimento encontra sua origem no que o Ocidente chama de subcultura. "Coloriage" foi criado no Japão, um país que não faz distinção entre cultura e subcultura".



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