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São Paulo, domingo, 19 de janeiro de 2003

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VISTA

Cidade tem déficit de moradia popular na periferia, mas setor imobiliário evita riscos e prefere priorizar o alto padrão

Desequilíbrio distancia bairros de SP

AMARÍLIS LAGE
FREE-LANCE PARA A FOLHA

O efeito dos anos não parece ter sido tão benéfico na área da habitação para o município de São Paulo, prestes a completar seu 449º aniversário. Basta observar nos mapas ao lado a acentuação de um cenário que, em 1991, já mostrava desequilíbrios.
Aumenta a pobreza. De acordo com o Mapa da Exclusão/Inclusão Social, realizado pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica), a cidade ganhou 1,1 milhão de pobres entre 1991 e 2000.
Aumenta a segregação econômica. Bairros nobres, como o Morumbi, onde a renda média de um chefe de família é de R$ 6.498, concentram cada vez mais as classes A e B. Bairros pobres, como o Grajaú, onde a renda fica em R$ 597, estão ainda mais pobres.

Rumo à periferia
Mudança mesmo, só a que vai no alto de um caminhão. Móveis e roupas de quem se vê obrigado, por questões financeiras, a sair do centro para a periferia, o que gera uma "explosão" populacional nas áreas mais pobres da cidade.
O Jardim Ângela, na zona sul, é um exemplo. Em nove anos, a população residente no local aumentou 71,3%. É o distrito com piores indicadores sociais, segundo o mapa elaborado pela PUC.
"São locais que tinham terras livres e baratas. A população empobrecida encontrou nessas áreas uma alternativa compatível com seu nível de renda decrescente", afirma o urbanista Kazuo Nakano, 32, um dos pesquisadores.
Fruto da migração silenciosa, surge um novo tipo de excluído social. "Nos anos 90, ampliou-se o contingente que identificamos como de uma nova exclusão", diz Márcio Pochmann, secretário do Trabalho. "São pessoas brancas, de famílias pequenas, nascidas aqui e de maior escolaridade."
Atualmente, 589 mil famílias vivem abaixo da linha da pobreza na cidade, conforme dados da Secretaria do Trabalho. Isso significa que 589 mil chefes de família possuem uma renda inferior a 1,5 salário mínimo por mês (R$ 300).
Segundo a Secretaria da Habitação, São Paulo possui um déficit habitacional de 380 mil unidades.
Um dos problemas para resolver a questão da moradia em São Paulo está no fato de que, antes de alcançar a parcela mais pobre da população, as unidades disponibilizadas pelo governo são adquiridas pela classe média baixa.
"O desafio hoje é conseguir que o setor privado atinja essa classe média baixa, para que a produção pública atenda os mais pobres", afirma Maria Lúcia Reffinati Martins, pesquisadora do Laboratório de Habitação, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.

Rumo ao Morumbi
No que depender do mercado, porém, a solução não deve vir tão cedo, afirma o engenheiro João Freire d'Ávila Neto, 44, diretor técnico da Amaral d'Ávila Engenharia de Avaliações.
"Para que sejam feitos investimentos nesse filão, é preciso haver expectativas promissoras para a classe trabalhadora. Quando o empresário vê o desemprego, tem medo de trabalhar nessa área."
Enquanto isso, o setor imobiliário prefere investir nos empreendimentos para o público A e B. O ano passado foi marcado pelo lançamento de imóveis de alto padrão. A tendência deve se manter.
"Vai haver valorização imobiliária muito grande nas regiões de operação urbana", afirma Fábio Duarte, coordenador de projetos da Urban Systems Brasil. "Mas são áreas como Santana e Campo Belo, que já são boas e vão ficar mais ricas. Quanto à composição socioeconômica da cidade, isso não vai mudar muito", avalia.
O mapa ao lado e os rankings que aparecem nas próximas páginas foram elaborados pela Urban Systems Brasil. Os dados foram obtidos a partir dos censos realizados pelo IBGE em 1991 e 2000 e trabalhados pela consultoria para pesquisas sobre o mercado imobiliário. Como o IBGE não classifica a população em classes sociais, a consultoria definiu a divisão conforme o rendimento declarado pelo chefe de família.


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