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FUNDO DE PENSÃO
Compra de ações pela fundação Ceres, dos funcionários da Embrapa, está sob investigação
Será que esse foi um bom negócio?
SANDRA BALBI
da Reportagem Local
Você compraria ações com baixa liquidez em Bolsa (poucos negócios) de uma companhia com
receitas em queda, prejuízos nos
dois últimos anos e que pagou
magros dividendos aos acionistas?
Se você acredita que, apesar do
passado condenável, tal empresa
poderá ter um futuro risonho e
que o preço do papel é uma pechincha, esse pode ser um bom
negócio. Mas considere mais um
detalhe: na Bolsa, essa ação é vendida por R$ 1,94, e o principal
acionista lhe oferece um grande
lote no mercado de balcão (negociações fora das Bolsas de Valores) por R$ 2,50.
Propusemos essa equação a três
analistas de mercado e todos pularam fora do negócio. Mas a Ceres, fundo de pensão dos funcionários da Embrapa, analisou os
números da empresa em questão,
a Tecelagem São José, de Minas
Gerais, e comprou 1,6 milhão de
ações preferenciais (sem direito a
voto), em maio do ano passado,
no mercado de balcão.
O vendedor foi a Encorpar, controlada pelo senador José de Alencar Gomes da Silva (PMDB-MG),
que também controla a Coteminas, uma das maiores empresas
do setor têxtil. A operação foi estruturada pelo Itaú Bankers
Trust, uma associação do banco
Itaú com o Bankers Trust, norte-americano, desfeita em 1998.
O negócio está sendo investigado pela Secretaria de Previdência
Complementar, xerife dos fundos
fechados de previdência, e pela
CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
A Secretaria apura possíveis irregularidades na compra das
ações pela Ceres. "As fundações
não podem adquirir ações no
mercado não-organizado de balcão. E, segundo a CVM, foi nesse
mercado que a transação ocorreu", diz Paulo Kliass, secretário
de Previdência Complementar
(veja texto abaixo).
A CVM está verificando se houve manipulação dos preços das
ações da Tecelagem São José no
período anterior à operação realizada no mercado de balcão.
Investigações
As investigações foram motivadas por reclamação de um acionista minoritário da São José,
Cláudio Motta de Faria, 47, que
estranhou o valor da colocação
das ações, bem acima do preço
em Bolsa, e recorreu à CVM.
"Os papéis da Tecelagem São
José têm, historicamente, baixa liquidez. Mas, dois meses antes da
colocação das ações, pela Encorpar, no mercado de balcão, o volume de negócios aumentou, puxando as cotações", diz Faria.
"Pode ter havido manipulação
para justificar o preço negociado
no mercado de balcão", diz.
Segundo dados da Economática, em 1996, os papéis da São José
foram negociados em apenas 30
pregões da Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo), totalizando
um volume de 229 mil ações. Em
1997, houve negócios com o papel
em apenas 33 pregões, totalizando 221 mil ações negociadas.
Em 1998, até maio, quando
ocorreu a colocação no mercado
de balcão, aconteceram 162 negócios, envolvendo um milhão de
ações. As cotações saltaram de R$
0,65, no dia 30 de janeiro, quando
começou a movimentação do papel, para R$ 2 em 11 de março.
De abril ao dia 8 de maio, quando a Encorpar vendeu suas ações
por R$ 2,50 no mercado de balcão
para a Ceres, o papel oscilou entre
R$ 1,85 e R$ 1,94 na Bovespa. No
dia 19 deste mês, data do último
negócio com o papel, seu preço
estava em R$ 0,55.
"Foi um bom negócio. Naquele
momento, as ações da São José estavam valendo no mercado menos da metade do seu preço registrado no balanço (valor patrimonial), demonstrando tecnicamente grande potencial de crescimento", diz Cleuber Oliveira, diretor
financeiro da Ceres.
O presidente da Encorpar, Josué
Gomes da Silva, também considera o valor da colocação dos papéis
uma pechincha. "A empresa estava de graça. Tanto que nós vendemos parte das nossas posições em
preferenciais e compramos ordinárias (com direito a voto)", diz.
Segundo o empresário, a Encorpar não teve nenhum ganho financeiro com a operação. "Do
ponto de vista de caixa, o negócio
foi neutro ou até um pouco negativo para nós", acrescenta.
A Encorpar vendeu 1,6 milhão
de ações preferenciais, no dia 8 de
maio e comprou 1.611.147 ações
ordinárias seis dias depois, passando a deter 33,26% do capital
votante da São José.
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