São Paulo, domingo, 01 de outubro de 2000

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+3 questões Sobre energias alternativas

1. Qual é o nível de dependência da economia mundial em relação ao petróleo?
2. Quais os principais avanços na pesquisa sobre fontes alternativas de energia?
3. Que tipo de impacto econômico e ambiental elas poderão ter?

Sinclair Guerra responde

1.
A resposta é clara: o nível de dependência em relação ao petróleo é, praticamente, absoluto. Japão, França, Itália e Alemanha importam -em média- quantidades superiores a 95% de seu consumo. Somente o G-7 (grupo dos sete países mais industrializados) consome 75% da demanda mundial dessa fonte de energia.

2.
Primeiramente, é necessário esclarecer a compreensão sobre fontes alternativas. Na maioria das vezes, estas são entendidas como fontes, ainda, no mínimo, exóticas. Por fontes alternativas devem ser entendidas aquelas não enquadradas entre as mais produzidas ou as mais consumidas. A expressão alternativa deve ser aplicada, nesse caso, àquelas de domínio tecnológico e cujos custos são perfeitamente praticáveis.
Pensando nas fontes alternativas que ainda demandam aperfeiçoamentos tecnológicos e maiores definições de engenharia econômica, pode-se afirmar que os avanços requeridos nas pesquisas são, muito mais, reflexos da política econômica vigente em todo o mundo hoje.
Mesmo assim, é possível e necessário que sejam priorizadas soluções cujo domínio tecnológico e econômico já é conhecido e administrável. Refiro-me, por exemplo, só para citar três bem conhecidas, às pequenas centrais hidrelétricas; a programas que considerem de maneira séria e adequada a utilização da co-geração térmica e, finalmente, à implantação, consequente e definitiva, de claros e factíveis mecanismos de conservação.

3.
De maneira sucinta, o impacto econômico só pode ser analisado se considerado em longo prazo. Um rápido e simples exercício de elasticidade-preço pode servir de indicador de tal impacto econômico. Do ponto de vista ambiental, também é necessária a periodização em curto e longo prazos. No imediato, o impacto sobre o meio ambiente poderá ser altamente danoso, muito mais pela falta de rumos a serem seguidos, um vez que o nível de consciência cresce paulatinamente, mas necessidades e o consumo ficarão abalados, criando sérios desencontros. Em largo prazo deverá voltar a prevalecer o nível de consciência que vinha se firmando, ao qual serão acrescidas as novas soluções encontradas.

Bautista Vidal responde


1.
A dependência é muito elevada, principalmente nos dez países que consomem 80% da energia usada no mundo. Em muitos casos, como nos Estados Unidos, esse consumo concentra-se em setores importantes, como o de transportes, eletricidade e geração de calor para fins industriais e domésticos (calefação). Por causa dos problemas ambientais, o petróleo vem tomando proporções muito maiores do que o carvão mineral, embora este ainda seja ponderável em alguns setores. Esse uso, porém, está condenado por causa do efeito estufa. O peso dos combustíveis derivados do petróleo é tal que podemos dizer que "o petróleo movimenta o mundo". Por isso os Estados Unidos ocuparam militarmente a região do mundo onde se localizam cerca de 80% das reservas de petróleo que restam. Ou seja, petróleo hoje é uma questão militar.

2.
Temos que considerar quais os pesos relativos dessas fontes alternativas. Ou seja, qual a participação delas na substituição efetiva do petróleo, posto que caminhamos para um colapso desse combustível de uso extensivo. Nessas condições, todas as alternativas são válidas, mesmo com contribuições insignificantes ou de valor localizado, como a energia eólica, a solar direta, a geotermia e muitas outras. Até a fissão nuclear ainda tem um papel nisso.
Também temos que considerar que são os combustíveis líquidos os de mais difícil substituição e a parte em que o petróleo é decisiva. Sem dúvida, as formas energéticas com dimensões compatíveis com a substituição do petróleo são os combustíveis derivados da biomassa, álcool etílico, óleos vegetais, carvão vegetal e gás de madeira, possíveis nos trópicos. Nessas condições o país que detém a melhor tecnologia, fruto de larga experiência, é o Brasil, apesar do retrocesso a que foram submetidas suas estruturas tecnológicas nos últimos anos. Um descalabro burro.

3.
Todos os derivados da biomassa são limpos do ponto de vista ambiental, ao contrário dos derivados de fósseis. Podemos imaginar o impacto econômico em um país que reúne as excepcionais condições de ser o principal responsável pelas alternativas aos derivados do petróleo, no caso o Brasil. Jamais nenhum país teve uma oportunidade geoeconômica das dimensões do continente brasileiro, com a "débâcle" mundial do petróleo.

QUEM SÃO

Sinclair Guerra
é doutor em energia pela Universidade de Paris e professor no departamento de energia da Universidade Estadual de Campinas. Pesquisa temas relacionados ao petróleo e gás natural.

Bautista Vidal
é engenheiro com pós-graduação em física. Foi secretário de Tecnologia Industrial do governo Geisel (1974-79) e um dos responsáveis pelo Programa Nacional do Álcool (Proálcool). É autor, com Gilberto Vasconcellos, de "Poder dos Trópicos" (Ed. Casa Amarela).



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