|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
+ moda
O establishment veste Armani
O estilista italiano diz que cria suas coleções para o público, e não para o mundo fashion
VANESSA FRIEDMAN
Giorgio Armani ocupa um lugar merecido na história da
moda por seu terno "power" desconstruído, que mudou a maneira como homens e mulheres
se vestem. E ocupa um lugar no
panteão da cultura pop por ter
apresentado a alta moda a
Hollywood e, na prática, criado
toda a experiência moderna do
tapete vermelho.
Por outro lado, nas últimas
temporadas venho sentindo
apenas confusão quando assisto a seus desfiles. Mulheres de
calçolas? Ou em chapéus que
parecem casquinhas de sorvete
invertidas? Mulheres em vestidos de noite com lantejoulas e
pregas fartas?
Não entendi o espírito da
coisa, e não fui a única. Mas
uma coisa é interessante: embora freqüentemente seja acusado de viver num mundo protegido e fechado, sua versão
própria e altamente lisonjeira
da realidade, Armani de certa
maneira entende por que nós
não entendemos.
"Crio coleções para o público
comprador, não para a indústria da moda", diz ele, não em
tom de pouco caso, mas um
pouco como se estivesse repetindo algo que já disse muitas
vezes antes, quando finalmente chega para a entrevista,
usando a camiseta justa azul
que é sua marca registrada (aos
72 anos de idade, Armani ostenta forma física surpreendente e gosta de exibir seus
músculos peitorais).
"Todo estilista nasce dentro
de sua caixinha de moda própria", diz ele, "e, se você tenta
mudá-la, o mundo fashion vai
dizer "isso não é Armani. Armani é isso ou aquilo. É esse o tipo
de Armani que quero ver'".
"No entanto ando nas ruas
em Londres e jovens vêm falar
comigo para discutir meu trabalho. É tão diferente daquilo
com que estão acostumados!
Não há piercings. E é muito
menos eclético."
"Gigolô Americano"
Parece que Giorgio Armani, o
mais establishment de todos os
estilistas, criador dos ternos de
executivos-chefe, bilionário
proprietário de seis residências, sempre se sentiu um "outsider". Incompreendido. É por
isso que sempre se sente movido a obrigar todo mundo a experimentar suas novidades.
Ele nasceu em 1934, em Piacenza, não numa das regiões
italianas conhecidas pela moda, e cresceu durante a Segunda
Guerra. Depois de abandonar o
estudo de medicina para trabalhar como comprador na La Rinascente, a mais célebre loja de
departamentos da Itália, foi
trabalhar para Nino Cerruti,
aprendeu a arte da alfaiataria e
finalmente montou seu negócio próprio aos 40 anos.
Sua linha de moda masculina, que jogou por terra o terno
tradicional dos homens de negócios, virou sucesso internacional, graças em parte a Richard Gere e "Gigolô Americano" (1980). E desde então, como Armani ressalta, o mundo
vem tentando congelá-lo no
tempo, naquele instante.
Sua linha de roupas para a
noite compôs uma grande parte da recente retrospectiva Armani montada pelo Guggenheim, e sua linha de acessórios cresceu 200% entre 2003 e
2005. Sua alta-costura é algo
raro: lucrativa.
"Houve uma época em que
eu fazia coisas rápidas, apenas
para constar das primeiras páginas dos jornais", prossegue,
possivelmente (espero) fazendo referência oblíqua às calçolas. "Mas existem outras maneiras, mais interessantes, de
chamar a atenção."
"Tenho muitas idéias próprias e quero assegurar que elas
sejam ouvidas." E ele acha que
elas são? "Às vezes", diz Armani. Ele faz uma pausa. "Mas às
vezes me sinto um Dom Quixote investindo contra moinhos
de vento. Tudo depende de como dormi na noite anterior."
A íntegra deste texto saiu no "Financial Times".
Tradução de Clara Allain.
Texto Anterior: + sociedade: Um roteiro do espaço-tempo Próximo Texto: Deodoro, o arrependido Índice
|