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A herança africana
Manolo Florentino
especial para a Folha
Para mim a grande lacuna da história brasileira é representada, paradoxalmente, pelo que de africano temos. Explico-me: durante mais de
300 anos dependemos dos africanos
para reproduzir nossa economia e
nossa sociedade. Isso significa que
parcela expressiva da população colonial era formada por homens e mulheres que não apenas haviam nascido na África, mas que também vieram ao mundo livres. Logo, o cativeiro não era de modo algum uma espécie de destino manifesto.
Do ponto de vista analítico, creio
perder-se muito quando se ignora ter
sido o "africano" (assim mesmo, entre aspas) uma cruel invenção do cativeiro, já que aqueles que por séculos a fio desembarcaram nos portos
coloniais eram, antes que nada, minas, cabindas, quiloas, rebolos, cassanjes, moçambiques e demais -experiências que nada indicam haver
fenecido sob a rubrica jurídica de
"escravo".
Por isso, a grande lacuna da historiografia brasileira deriva de tomar o
escravo africano unicamente a partir
de seu desembarque nos portos brasileiros, procedimento que tem ensejado a apresentação de soluções algo
artificiais a intrincados problemas de
nossa história -especialmente os
relativos a nossa identidade.
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