São Paulo, domingo, 02 de agosto de 2009

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VISÕES DE CANUDOS

CONFLITO TEM INTERPRETAÇÕES CONTROVERSAS

DA REDAÇÃO

As razões para a Guerra de Canudos, no sertão baiano, variam de acordo com a interpretação dada aos documentos da época. Desde o final do século 19, grupos sociais diversos as explicaram de maneiras diferentes.
Para os grandes proprietários da região, o líder Antônio Conselheiro incentivava saques e invasões; para as autoridades republicanas, tratava-se de uma revolta monarquista; para cidadãos que acompanharam a campanha militar pelos jornais, tornou-se uma questão de honra.
Entre os historiadores surgiram variadas versões do Conselheiro, de manipulador de uma seita milenarista a revolucionário socialista. Atualmente, tem sido identificado como um líder comunitário, de uma cidade sem inovações especialmente revolucionárias, que se tornou um bode expiatório da aristocracia.
O beato Antônio Conselheiro se estabeleceu na região, com centenas de seguidores, em 1893. A figura do Conselheiro é por vezes associada ao messianismo, mas sobreviventes do conflito relataram que ele se apresentava apenas como um líder cristão leigo.
A República, instaurada em 1889, era ainda assimilada. A comunidade de Canudos, relativamente independente dos grandes proprietários da região, foi tachada antirrepublicana por seus adversários. Uma das explicações para o nascimento do conflito é a insatisfação de fazendeiros locais, que perdiam mão-de-obra barata, poucos anos depois do fim da escravidão, para o povoado de Canudos.

Acaso ou utopia
A vila seguia a tradição religiosa do trabalho comunitário. Ao longo do século 20, essa característica justificou sua associação ao comunismo e a diversas utopias. Professores ouvidos pela Folha rejeitam as explicações que veem em Canudos um "projeto" social, por exemplo porque havia desigualdade interna.
Para Manuel Domingos Neto, da Universidade Federal Fluminense, "nenhuma análise tem levado em conta rigorosamente a crise da pecuária extensiva. Ao longo do século 19, houve muito deslocamento, muita mortandade -a seca de 1877 matou meio milhão de pessoas. A população já se deslocava. Poderia ser qualquer lugar -o Piauí era a região da pujança na época-, mas alguns foram para Canudos".
Em 1896, um boato de que o Conselheiro planejava saquear comunidades vizinhas -ou cobrar à força uma dívida- ensejou a demonstração de poder por parte do Estado baiano. A primeira expedição -ou tentativa de restaurar a ordem- contra Canudos, liderada pelo tenente Pires Ferreira, foi derrotada.
Em janeiro de 1897, a segunda expedição, com centenas de homens sob o comando do major Febrônio de Brito, também fracassou. Canudos tornou-se falada por todo o Brasil. Na terceira expedição, também malsucedida, morreu o comandante das tropas, o coronel Moreira César.
Popularizou-se a imagem, nunca referendada, de que o Conselheiro representasse os interesses da princesa Isabel. Sob a bandeira de uma República "ameaçada", entre 6.000 e 10 mil soldados rumaram a Canudos na quarta expedição, a partir de junho de 1897. Calcula-se que fossem dez vezes mais numerosos que os combatentes canudenses.
Com uma estrutura de guerra que incluía artilharia e avanço de soldados em duas colunas, o conflito durou até 5 de outubro. No dia seguinte, a vila foi incendiada.


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