São Paulo, domingo, 04 de outubro de 2009

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O vício da amizade

Arquivamento de investigações envolvendo irregularidades no Congresso reforça premissa de que parlamentares se omitem na punição de colegas e contribui para a imagem negativa da instituição

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Nenhuma explicação foi tão feliz como a do deputado Edmar Moreira (PR-MG) para definir a dificuldade de congressistas quando precisam investigar e punir seus pares. O "vício insanável da amizade" é o maior obstáculo à frente de um processo de cassação, disse ele.
Moreira foi vítima e beneficiário do seu axioma. Quando deu sua explicação em público, acabara de ser eleito corregedor da Câmara, em fevereiro passado. Passou então a ser escrutinado pela mídia.
Além do castelo de propriedade de sua família, em Minas Gerais, descobriu-se que o deputado usava a verba indenizatória para pagar serviços de segurança pessoal a suas próprias empresas.
Removido do cargo de corregedor, Moreira enfrentou um processo no Conselho de Ética da Câmara. Ao final, acabou inocentado -apesar das provas do uso do dinheiro público nas empresas do congressista.
Em 1997, deputados foram gravados em conversas informais admitindo ter vendido o voto a favor da aprovação da emenda da reeleição -que permitiu a Fernando Henrique Cardoso (PSDB) ter concorrido a um segundo mandato em 1998. Não houve CPI nem ninguém foi punido.
No caso do mensalão, em 2005, dezenas de congressistas estavam envolvidos num esquema para reforçar a base governista do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso. Só três deputados foram cassados, entre eles o ex-ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, denunciado pelo Ministério Público sob o epíteto de "chefe da quadrilha" do mensalão.
Dirceu e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares ainda aguardam julgamento, alegam inocência e trabalham na volta à vida pública.
O restante das dezenas de acusados se salvou. No ano seguinte Lula foi reeleito para mais um mandato no Planalto e hoje segue com a maior base no Congresso Nacional.

Atenção e esquecimento
Neste ano, mais de 90 casos de irregularidade foram registrados na Câmara e no Senado. Ninguém foi punido. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), enfrentou 11 acusações, variando da responsabilidade por atos secretos ao emprego de funcionários fantasmas. Foi absolvido.
O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), esteve envolvido na chamada "farra das passagens aéreas". Mais da metade dos 513 deputados usaram o benefício para passear com a família e amigos. No caso de Temer, ele viajou com mulher, amigos e familiares para Porto Seguro (BA), em janeiro de 2008, período de férias no Congresso. Nada aconteceu.
Não é de hoje que casos assim chamam a atenção da mídia num primeiro momento, mas acabam esquecidos. (FR)


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