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Ainda há clássicos à espera de tradução
Marcos Guterman
da Redação
Enfim, uma grande editora brasileira resolveu dedicar-se a um clássico do estudo
do Holocausto e do nazismo. Afeito mais às
lágrimas de Anne Frank e Oskar Schindler,
o mercado editorial não se interessa por títulos básicos para entender Hitler e seus crimes. Por esse motivo, a iniciativa de lançar
"Eichmann em Jerusalém" (1963) deve ser
comemorada.
Mas é pouco. Há vários títulos fundamentais que só existem para inglês ler, como
"Hitler, a Study in Tyranny" (1962), de
Allan Bullock, "The Last Days of Hitler"
(1947), de Hugh Trevor-Roper, e, especialmente, "The Destruction of The European
Jews" (1961), de Raul Hilberg, talvez o principal livro sobre o Holocausto, fonte de
Hannah Arendt e dos estudiosos posteriores.
O mérito de "The Destruction..." e de
"Eichmann..." é justamente o esvaziamento
do discurso corrente sobre o genocídio, que
alimenta Hollywood e as estantes de best sellers com o propósito de "preservar a memória" -justificativa mais comum para a
infinita reedição dos emocionantes textos
sobre os heróis e vilões da desgraça alheia.
"The Destrucion..." e "Eichmann..." foram os primeiros estudos que tiveram a coragem de questionar, por exemplo, o papel
dos próprios judeus no genocídio, o que até
hoje irrita os sobreviventes.
Hilberg e Arendt também foram os primeiros a qualificar o Holocausto como "raison d'Etat", tese central para entender como foi possível a um governo, ainda que totalitário, mobilizar boa parte dos recursos
de um país em guerra com o objetivo de
destruir um povo.
Ou seja: ao estabelecerem que a Solução
Final não resultou de uma explosão de ódio,
mas de uma fria e complexa estrutura burocrática -que funcionava sob as barbas das
democracias ocidentais e com a colaboração indireta de líderes judeus-, Hilberg e
Arendt inauguraram um duro debate, que
leva à reflexão sobre as responsabilidades
de todos perante a barbárie.
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