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Anani Dzidzienyo, um dos primeiros afro-brasilianistas,
influencia a nova geração
História de um pioneiro
especial para a Folha, em Providen
Uma das vantagens para a nova
geração de brasilianistas é a existência de trabalhos e professores
da geração anterior. E, no caso dos
estudos de raça e etnicidade, ninguém mais importante do que o
historiador ganês Anani Dzidzienyo, 57.
Um dos primeiros "afro-brasilianistas", ao lado de Michael
Mitchell e Michael Turner, Dzidzienyo, pouco conhecido no Brasil, é referência quase obrigatória
para os novos pesquisadores americanos -boa parte negra- que
se aventuram a entender as relações raciais e étnicas no país.
Dos entrevistados pela Folha
que têm trabalho em raça e etnicidade, dois deles -Jeffrey Lesser e
Melissa Nobles- tiveram com
Dzidzienyo as primeiras aulas sobre o Brasil, ainda durante a graduação, na Universidade de
Brown. "O professor Dzidzienyo
é o padrinho do meu trabalho e da
minha geração", diz Nobles.
A importância de Dzidzienyo fica clara quando se lêem os agradecimentos dos livros publicados recentemente. Ele têm seu nome
pouco comum presente em quase
todas as obras que tratam de relações raciais: além de Kim Butler,
Anthony Marx, Michael Hanchard e John Burdick fazem referência a ele em seus livros.
Sendo fácil encontrar seu nome
nas introduções, ele já não aparece
tanto nas bibliografias. Num sistema acadêmico onde a regra número um é o "publish or perish"
(publique ou pereça), Dzidzienyo
escreveu apenas alguns artigos e
um pequeno livro. "The Position
of Blacks in Brazilian Society" (A
Posição do Negro na Sociedade
Brasileira), lançado em 1971, tem
pouco mais de 20 páginas e não
chegou a ser traduzido para o português.
No Brasil, Dzidzienyo publicou
dois artigos em revistas acadêmicas de pequena circulação. Curiosamente, o historiador ganês também não orientou formalmente
nenhum dos novos trabalhos.
São outros os motivos que explicam a importância de Dzidzienyo:
sua formação como historiador
social com uma visão "de baixo
para cima", o fato de ser professor no centro mais importante de
estudos brasileiros nos EUA, seus
contatos no Brasil com ativistas
negros e acadêmicos e uma boa
dose de carisma. "Anani tem um
espírito generoso, é de muito entusiasmo, empatia, sempre dá
apoio e é uma ligação entre os
americanos e os brasileiros", diz
Thomas Skidmore, seu colega em
Brown.
A história de Dzidzienyo não poderia ser comum. Nascido em
1941, em uma família de classe média em Gana (costa oeste africana), ele teve a oportunidade de
testemunhar a independência do
próprio país. "Sempre lembro como nasci, como fui criado, como
foi crescer na época da independência. Tenho um certo orgulho
de ser de um dos primeiros países
da África a se tornar independente", diz o historiador à Folha, em
sua casa, em Providence (EUA).
O longo caminho entre Gana e o
Brasil começou com um concurso
de redação promovido por um
jornal americano. Um dos 36 escolhidos entre estudantes do mundo
inteiro, Dzidzienyo recebeu uma
viagem para Nova York, a primeira que fez para os Estados Unidos,
aos 18 anos. Essa viagem rendeu
contatos para uma bolsa de estudos, e Dzidzienyo voltou para os
EUA em 62, onde estudou numa
faculdade de maioria branca.
Dos EUA, Anani foi para a Inglaterra, onde estudou na Universidade de Essex, que tinha um programa de América Latina, com
dois professores especializados em
Brasil e alguns alunos brasileiros.
Foi a influência de um desses professores, o francês Christian Anglade, que o convenceu a estudar o
Brasil.
Dzidzienyo esteve pela primeira
vez no país em 70, já falando português, e foi morar em Salvador,
onde passou quase um ano. No
começo, impressionado com as
semelhanças da capital baiana
com a África, Dzidzienyo viu com
o tempo que não era bem assim.
"Não tinha praticamente um balconista negro, eu vi só em uma
farmácia. Naquela época, a Bahia
parecia a Islândia", diz.
De volta a Inglaterra, escreveu e
lançou seu único livro. Mesmo
com poucas páginas, as críticas à
situação do negro no Brasil e ao
seu maior ícone, Pelé, chamaram
a atenção da embaixada brasileira
em Londres, que lançou uma nota
formal contra o historiador. Concluídos os estudos na Inglaterra,
Dzidzienyo voltou para os EUA,
onde começou a trabalhar na Universidade de Brown, em 73. Ali dá
aulas até hoje, sobre a história dos
negros no Brasil e na América Latina.
Quando o tema é o negro no
Brasil, fica fácil perceber como
Dzidzienyo está afinado com a nova geração, principalmente no
tom crítico e sempre comparativo.
O português cadenciado, o forte
sotaque, os risos demorados e os
gestos largos quase escondem sua
visão pessimista das relações raciais no Brasil.
Para Dzidzienyo, o país ficou para trás em relação aos EUA e até
mesmo à África do Sul. "O Brasil
tem de fazer alguma coisa", diz.
Nem a miscigenação faz do Brasil uma exceção: "A mistura não
significa a ausência da hierarquia.
O mulato não é negro nem branco, mas puxa para o lado branco
porque na sociedade há a hierarquia: branco, mulato e depois o
negro. Não existe nenhum país,
misturado ou não, onde ser branco é uma coisa neutra. Sempre é
uma vantagem".
(FM)
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